CURATELA DE PESSOAS VULNERÁVEIS E AS DIRETIVAS DE CURATELA: FRAGILIDADES LEGAIS E SUGESTÕES DE APRIMORAMENTO À LUZ DO PRINCÍPIO DA VONTADE PRESUMÍVEL

CURATELA DE PESSOAS VULNERÁVEIS E AS DIRETIVAS DE CURATELA: FRAGILIDADES LEGAIS E SUGESTÕES DE APRIMORAMENTO À LUZ DO PRINCÍPIO DA VONTADE PRESUMÍVEL

Carlos Eduardo Elias de Oliveira1

Resumo

O texto trata das Diretivas de Curatela como um instrumento para viabilizar a dignidade da pessoa vulnerável. Indica que, em nome do princípio da vontade presumível e a depender das particularidades do caso concreto, deve-se flexibilizar regras do Código Civil baseadas em um padrão médio. Aponta para a regra do respeito à vontade da pessoa vulnerável ao tempo de sua lucidez, com sugestão de alterações normativas.

Palavras-Chave: Vontade presumível. Interdição. Pessoa vulnerável. Curatela.

Sumário

Introdução.

1.   Ordenamento jurídico atual

1.1.           Cabimento da curatela.

1.2.           Interesse público na curatela.

1.3.           Princípio da vontade presumível como diretriz na proteção da pessoa vulnerável: a possibilidade de doação de bens do curatelado e a regra do respeito à vontade da pessoa vulnerável ao tempo de sua lucidez.

1.4. Ordem de preferência na escolha do curador

2. Diretivas de Curatela.

2.1.           Definição.

2.2.           Limites: ampla liberdade da pessoa.

2.3. Cláusula de Pró-labore ao curador

2.4. Cláusula de rejeição de potenciais curadores e cláusula de indicação de profissional

3. Necessidades de aprimoramento.

3.1.           Clareza textual no Código Civil

3.2.           Aparato estatal de efetividade das Diretivas.

3.3.           Soluções privadas: o “anjo da guarda”.

CONCLUSÕES.

Referências bibliográficas.

 

Introdução

Certo um dia[1], um empresário bem-sucedido de 45 anos, solteiro, externou a um advogado uma preocupação:

– quem será o meu curador caso eu venha a perder a lucidez?

O único parente desse empresário era um filho, com quem infelizmente não foi possível criar uma boa convivência.

O relacionamento com esse filho era salpicado por animosidade por conta da personalidade avarenta e fria do filho.

O empresário, com olhos marejados, dizia:

– Eu tentei de tudo para ser próximo desse filho, mas ele invariavelmente desrespeita-me, despreza-me e só se aproxima para tentar me chantagear e conseguir dinheiro.

A confiança do empresário nesse filho é “zero”! Ele sabe que, se viesse a precisar de ajuda, esse filho agiria como um egoísta perigoso e sovina.

O solitário empresário relatou que a única pessoa de sua confiança é um amigo de infância, com quem ele se encontra semanalmente. Esse amigo é daquelas pessoas inflexíveis em antepor a lealdade à cupidez, o próximo a si mesmo, o amor à avareza.

Quando o empresário fica doente, é a esse amigo que ele se socorre.

O empresário disse ao advogado:

– Se eu futuramente vier a perder minha lucidez, eu não quero, jamais, que meu filho seja o meu curador, porque infelizmente não tenho proximidade afetiva com ele. Eu quero que esse meu amigo seja meu curador.

Além disso, o empresário, sabendo dos sacrifícios pessoais que esse amigo assumirá, completou:

– Em compensação a tudo o que esse meu amigo fará enquanto curador, quero que seja paga uma remuneração altíssima para ele em compensação pelos serviços de curador. Quero que seja oferecida uma remuneração corresponde a 80% do teto do funcionalismo público.

Nesse caso, indagamos: o que esse empresário pode fazer? Há ferramentas jurídicas adequadas para fazer a vontade desse empresário ser respeitada no caso de sua eventual obnubilação?

Há uma outra história real para ilustrar o debate.

Um servidor público do alto escalão, de 65 anos de idade, viúvo, havia se aposentado com um salário correspondente ao teto do funcionalismo público. Ele já possui um imóvel de alto padrão quitado e também possui uma considerável poupança.

Ele tinha uma filha, que não deu muita sorte profissionalmente. A filha vivia ainda às custas do seu pai, sob um padrão de classe média alta. Viajava, de férias, para o exterior, dirigia um bom carro, frequentava bons restaurantes, tudo sob o custeio do seu pai.

A filha – em decorrência de um relacionamento de noite de verão com um desconhecido – virou mãe de um cativante menino que, infelizmente, sofria de algumas limitações psicológicas. O avô apressou-se em custear tudo do netinho: plano de saúde, educação em uma escola de alto padrão, roupas, lazer etc. A filha e o neto eram tudo o que aquele valetudinário servidor público aposentado tinha na vida.

A maior alegria do avô era ver sua descendência junto de si, vivendo sob o mesmo teto dele e recebendo todo o seu suporte (inclusive, financeiro).  

Tudo ia bem até que o avô perdeu a lucidez aos 65 anos de idade. Ele já não mais articulava as ideias com lógica. Em consequência, ele precisou ser interditado judicialmente, e sua filha nomeada curadora.

O problema surgiu quando o juiz, seguindo a letra fria da lei, proibiu que o dinheiro do avô fosse utilizado para custeio das despesas pessoais da filha e do neto. O argumento do juiz foi o de que os arts. 1.749, II, e 11.781 do Código Civil (CC) proíbem expressamente doações dos bens do curatelado[2].

O juiz fixou um pró-labore de 1 salário-mínimo para a filha como remuneração por sua função de curadora. Determinou, ainda, que o dinheiro do curatelado fosse utilizado exclusivamente no seu interesse, de modo que até mesmo as despesas comuns da casa – como luz e água – fossem rateadas com a filha.

Na prática, essa decisão acabou levando a já gorda poupança do servidor público interditado a uma situação próxima à obesidade. O neto teve de sair da escola de alto padrão para uma outra gratuita, que lhe oferecia menor suporte. A filha não mais tinha dinheiro, sequer, para colocar gasolina no carro e teve de reduzir drasticamente o padrão de vida.

Em outras palavras, o servidor público interditado – indefeso – teve de assistir à ruína do que lhe fazia feliz, porque o juiz, seguindo a letra fria da lei, atropelou a vontade presumível desse servidor, identificável com base no seu comportamento ao tempo da lucidez.

No futuro, quando – para lembrar Raul Seixas – a Morte vestir-se de cetim para beijar o servidor interditado em uma esquina, a sua poupança estará obesa, ao passo que sua filha e seu neto estarão raquíticos de cultura, de prazer e de vida por conta das privações patrimoniais causadas pela aplicação fria da lei.

Faça-se uma emenda à história acima. O neto chegou a ajuizar uma ação de alimentos contra o avô, mas obteve uma pensão alimentícia diminuta que, na prática, não lhe elevou muito o padrão de vida.

Diante desse cenário, indago: será que esse é mesmo o cenário desenhado pelo nosso ordenamento?

Partimos de duas histórias baseadas em fatos reais para externar o que, na prática, acaba acontecendo em muitas situações, apesar de – ao nosso sentir – o ordenamento jurídico dar outro norte.

Exporemos, neste texto, pontos que devem ser aprimorados, seja na interpretação das leis, seja na edição de atos normativos legais e infralegais destinados a viabilizar a concretização efetiva do ordenamento.

Entendemos que a lei e a jurisprudência precisam avançar para acudir situações como essas.

1.    Ordenamento jurídico atual

1.1.          Cabimento da curatela

Quando uma pessoa perde a lucidez (como nas hipóteses de estágios avançados de Alzheimer), o ordenamento jurídico respalda-lhe com um instituto de amparo a vulneráveis: a curatela.

A curatela consiste em um múnus (encargo) atribuído a uma pessoa (curador) para cuidar dos interesses da pessoa vulnerável (curatelado). Em regra, a curatela é estabelecida quando da interdição da pessoa vulnerável, fruto de um procedimento judicial.

1.2.         Interesse público na curatela

A proteção das pessoas vulneráveis é questão de interesse público, porque o Estado Brasileiro é fundado no respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal – CF[3]).

Por isso, o ordenamento obriga o Poder Público a agir em favor das pessoas vulneráveis, seja por meio de políticas públicas, seja por intermédio da atuação direta e específica de agentes estatais.

No caso de pessoas que perderam a lucidez, o Ministério Público – que foi ungido constitucionalmente como defensor da Ordem Jurídica – tem o dever de atuar em proteção a essa pessoa vulnerável, ajuizando a ação de interdição ou atuando como fiscal da lei (custos legis) nos processos de interdição em curso. Di-lo o art. 178, II, do Código de Processo Civil – CPC[4].

1.3.         Princípio da vontade presumível como diretriz na proteção da pessoa vulnerável: a possibilidade de doação de bens do curatelado e a regra do respeito à vontade da pessoa vulnerável ao tempo de sua lucidez

Qual é a diretriz a ser seguida pelo juiz, pelo Ministério Público e por todos os atores públicos ou privados que vierem a lidar com pessoas vulneráveis?

A diretriz é o princípio da vontade presumível, um dos pilares do Direito Privado, conforme expusemos em outro texto[5]. Segundo esse princípio, o ordenamento deve prestigiar o respeito à vontade (ainda que presumível) das pessoas.

Trata-se princípio que se irmana com a dignidade da pessoa humana, pois, em última instância, nada é mais digno a um ser humano do que lhe assegurar o exercício da sua liberdade de gerir a própria vida.

Quando a vontade efetiva de uma pessoa for conhecida, ela deve prevalecer em detrimento da vontade presumível, porque a dignidade da pessoa humana precisa ter concreção em cada caso específico.

É claro que essa regra pode ser excepcionada, quando houver confronto com valores ou princípios que, na hipótese específica, revele-se prestigiosos. Por exemplo, a vontade real de uma pessoa em matar outrem não pode prevalecer, porque viola, nesse caso concreto, um valor superior do ordenamento: a proteção à vida. Nessa situação excepcional, a vontade presumível prevalecerá.

A vontade presumível consiste naquela que o homo medius (ou, na linguagem dos juristas ingleses, the man on the Clapham omnibus) teria.

A figura do homo medius refere-se a um recurso jurídico-ficcional destinado a indicar o que pensa um indivíduo que tenha o padrão cultural, jurídico e moral de uma determinada sociedade em específico momento, respeitado, porém, as particularidades do caso concreto.

Para esquadrinhar o homo medius a fim de identificar a sua vontade presumível, o jurista precisa fazer duas investigações.

Uma é de natureza objetiva e abstrata: o jurista deve identificar quais são os valores jurídicos, morais e culturais da sociedade naquele momento. Para reduzir a margem de subjetivismos nessa investigação objetiva, a legislação já costuma definir a vontade presumível da pessoa. Em muitos casos, o legislador – que é o representante do povo – já delineia qual é a vontade presumível da pessoa, como ocorre nos casos de sucessão ab intestato (sucessão mortis causa quando não há testamento).

Não basta, porém, a supracitada investigação objetiva e abstrata acima. O jurista há de realizar uma segunda investigação, de natureza casuística. Deverá conhecer as particularidades da pessoa, perquirindo a sua história pessoal em busca de suas preferências pessoais. Trata-se de uma tarefa trabalhosa e difícil, mas imprescindível, para assegurar, no caso concreto, o respeito à dignidade da pessoa humana.

Após realizar as duas investigações acima (a objetiva e a casuística), é que o jurista oferecerá uma solução ao caso concreto. Eventualmente, o jurista deverá, inclusive, interpretar restritivamente alguma regra legal assentada em uma análise abstrata em prestígio às particularidades do caso concreto, porque – por vezes – “a lei diz mais do que queria” (lex plus dixit quam voluit).

Pense, por exemplo, em uma pessoa – de consideráveis posses – que, durante toda a vida, foi apaixonado por ir a jogos de futebol, a comprar camisas do Flamengo e a fazer doações mensais a uma família carente da sua cidade. Suponha-se que ela venha a perder a lucidez. No caso de sua interdição com nomeação de curatela, qual será a diretriz a ser seguida na proteção dessa pessoa vulnerável?

A diretriz será a vontade presumível dessa pessoa, a qual será identificada após duas investigações.

De um lado, sob uma investigação objetiva e abstrata, poder-se-á lançar mão das regras do Código Civil que versam sobre curatela (arts. 1.728 ao e 1.781 do CC). Entre elas, destacamos uma: a proibição de doação de bens do curatelado a terceiros (arts. 1.748, II, e 1.781 do CC). Essa regra parte da premissa de que o homo medius no Brasil – se pudesse exprimir sua vontade com lucidez – não haveria de, ao perder a lucidez, querer doar seus bens a terceiros.

De outro lado, sob uma investigação casuística, verifica-se que o flamenguista da história acima sempre foi uma pessoa aficionada por assistir a jogos de futebol e por fazer caridades financeiras a determinada família carente de sua cidade. Para ele, faz parte da razão de viver dele ver o Flamengo em campo e ajudar financeiramente uma determinada família carente. Sua história pessoal demonstra isso.

Após realizar essas duas investigações, cabe ao jurista desenhar, no caso concreto, a vontade presumível desse flamenguista que perdeu a lucidez, tudo com o objetivo de fixar o modo como a curatela será exercida. É claro que poderá haver divergências entre os juristas nesse delineamento da vontade presumível, mas esse potencial de discordância é inerente à ciência jurídica. Miguel Reale reconhecia esse natural grau de certa indeterminação do Direito por meio de sua teoria tridimensional do direito e do seu culturalismo jurídico.

No caso acima, entendemos que a vontade presumível a servir de bússola no exercício da curatela consistirá em tentar manter as práticas do flamenguista antes da sua interdição. Deve-se atentar para o que chamamos de regra do respeito à vontade da pessoa vulnerável ao tempo de sua lucidez. O curador, portanto, deverá esforçar-se – dentro do que for possível – por garantir que o flamenguista siga a ver o Mais Querido brilhar em campo e siga a doar dinheiro à família carente beneficiada antes da interdição.

Os arts. 1.748, II, e 1.781 do CC – que proíbem a doação de bens do curatelado – deverão ser interpretados restritivamente no caso concreto, pois esse dispositivo “disse mais do que queria” (lex plus dixit quam voluit). Na verdade, ele deve ser interpretado no sentido de que doações podem ser feitas excepcionalmente, quando condizerem com a regra do respeito à vontade da pessoa vulnerável ao tempo de sua lucidez.

Acresça-se que essa solução seria ainda mais reforçada se eventualmente houvesse algum documento indicando que, antes da perda de lucidez, o flamenguista havia externado sua vontade de continuar com as doações mesmo após eventual interdição.

Isso, porque a vontade efetiva da pessoa vulnerável deve receber o máximo de prestígio, em intensidade maior do que a vontade presumível, salvo se, no caso concreto, algum outro valor mais forte desaconselhar.

1.4. Ordem de preferência na escolha do curador

Quem deverá ser nomeado curador no caso de interdição de uma pessoa vulnerável?

O Código Civil merecia ser mais claro e textual. Entendemos que, como as regras de tutela são extensíveis para a de curatela no que couber por força do art. 1.781 do Código Civil, o melhor entendimento é o descrito abaixo.

Em primeiro lugar, deve ser nomeado curador quem tenha sido indicado, em documento autêntico, pelo próprio curatelado antes da perda da lucidez. Trata-se do que chamamos de curatela autêntica, fundada nos arts. 1.729 e 1.781 do Código Civil. Batizamos assim, porque decorre de uma nomeação da própria pessoa.

À falta de indicação, deve-se observar a ordem de preferência do art. 1.775, §§ 1º e 2º, do CC: 1º) cônjuge ou companheira; 2º) ascendentes; 3º) descendentes. Trata-se do que chamamos de curatela legítima, por decorrer de lei.

Em sendo inviável as hipóteses acima, o juiz nomeará uma pessoa idônea (art. 1.775, § 3º, do CC). Trata-se do que designamos de curatela dativa.

As nomenclaturas acima são inspiradas nas que a doutrina costuma utilizar para a tutela, dentro da sua classificação quanto à origem (como lembra Flávio Tartuce[6]).

A ordem preferencial acima pode ser flexibilizada se houver elementos concretos que o justifiquem, tudo em nome do princípio do melhor interesse da pessoa vulnerável. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, por exemplo, afirmam com autoridade, in verbis[7]:

Claro está, todavia, que esse rol não é vinculativo, de maneira que o juiz fará a escolha sempre em prol do melhor interesse do curatelado.

(…)

Nesse sentido, observe-se o Enunciado 638 da VIII Jornada de Direito Civil da Justiça Federal: “ENUNCIADO 638 – Art. 1.775: A ordem de preferência de nomeação do curador do art. 1.775 do Código Civil deve ser observada quando atender ao melhor interesse do curatelado, considerando suas vontades e preferências, nos termos do art. 755, II, e § 1º, do CPC”.

Se, por exemplo, a pessoa que lidere a lista preferencial acima for manifestamente nociva à pessoa vulnerável (ex.: destila ódio mortal contra a pessoa vulnerável), ela não deve ser nomeada curadora.

Esse cenário legal decorre do princípio da vontade presumível. O legislador faz a lista preferencial de modo a prestigiar a vontade efetiva.

Nos próximos capítulos, veremos, porém, que, na prática, a curatela autêntica não consegue ter efetividade por falta de um suporte estatal adequado, o que torna recomendável a edição de normas.

2. Diretivas de Curatela

2.1.         Definição

Designamos de “Diretivas de Curatela” o documento por meio do qual a pessoa declara qual é sua vontade caso venha a ser submetida a curatela no futuro. É uma espécie de “testamento” para o caso de sujeição a curatela. 

Não se trata de um documento recorrente na atualidade, seja por desconhecimento da população, seja pela falta de aparato estatal destinado a lhe assegurar efetividade. Defendemos sua popularização e a criação de aparatos estatais para efetividade, conforme exporemos mais à frente.

Nas Diretivas de Curatela, a pessoa apontará quem deverá ser nomeado curador (curatela autêntica), qual remuneração será devida a ele e como o curatelado deverá ser cuidado.

Poderá, por exemplo, estabelecer que, no caso de vir a ser interditado, o curador deverá velar para que, dentro do que for possível:

1) sejam feitas doações periódicas a determinada família carente ou a determinada instituição, tendo em vista a grande proximidade afetiva do curatelado com esses beneficiários;

2) o curador seja levado para viagens à praia de Itapuã em Salvador a cada semestre, tendo em vista a forte proximidade sentimental do curatelado com as areias que inspiravam as tardes de Vinicius de Moraes e Toquinho;

3) seja o curador remunerado com um valor mensal corresponde a 80% do teto do funcionalismo público, tendo em vista que, ao sentir do curador, essa quantia seria a justa para compensar a dedicação integral do curador, ainda mais tendo em vista “casas de repouso” de alta qualidade cobram mensalidades até superiores a essa cifra;

4) seja o curatelado levado, em dois dias específicos da semana, para assistir a um show, a um teatro municipal, a um restaurante ou a um determinado encontro congregacional de sua religião, tendo em vista que isso faz parte da essência da personalidade do curatelado.

5) seja o curatelado hospedado na suíte presidencial do Copacabana Palace durante o resto da vida, porque seu sonho foi sempre viver sob o conforto desse clássico hotel.

2.2.        Limites: ampla liberdade da pessoa

As Diretivas de Curatela devem ser, ao máximo, respeitadas por coadunar com o princípio da vontade presumível da pessoa vulnerável. Elas documentam a vontade expressa da pessoa antes do pôr do sol de sua lucidez. Trata-se daquilo que realizará plenamente a pessoa quando esta – por um esvaecimento de sua lucidez – não puder mais agir por conta própria. Cuida-se de uma das maiores expressões da dignidade da pessoa humana in concreto.

Por essa razão, a regra é a de que as Diretivas de Curatela devem ser observadas, ao máximo, pelo juiz e pelo curador em favor da pessoa vulnerável.

Há, porém, exceções. As Diretivas de Curatela devem ser afastadas em três principais situações.

A primeira é a existência de elementos concretos que, de modo inequívoco, indiquem a desatualização das Diretivas de Curatela. Isso ocorreria quando, depois da elaboração das Diretivas de Curatela, ocorreu algum fato que, de modo inequívoco, indique que a pessoa mudou ou teria mudado as Diretivas.

Pense, por exemplo, em uma Fulano que, no ano de 2022, tenha escrito nas suas Diretivas de Curatela o seguinte:

– Se eu vier a ser submetido a curatela, quero que o meu amigo Beltrano seja o curador, porque ele sempre foi o amigo mais leal que eu já tive na vida.

Suponha que, em 2023, seja descoberto que Beltrano era um traidor, que estava passando Fulano pessoa para trás nos negócios e que havia tentado assassinar Fulano.

Imagine que Fulano não altere as Diretivas, seja por esquecimento, seja por indolência, seja por qualquer motivo.

Nessa hipótese, se Fulano vier a ser interditado, o juiz deverá avaliar se, à luz desses fatos, as Diretivas de Curatela devem ou não ser desconsideradas por perda de objeto e por desatualização. No exemplo acima, entendemos que as diretivas deverão ser afastadas, salvo se houver alguma prova cabal de que a Fulano perdoou Beltrano e, mesmo assim, queria a subsistência das Diretivas de Curatela.

Aliás, exatamente para evitar essas discussões, é fundamental que, anualmente, a pessoa renove as Diretivas de Curatela, seja por um ato de ratificação, seja pela elaboração de outro instrumento de Diretivas de Curatela.

A segunda exceção em que as Diretivas de Curatela devem ser afastadas é quando elas, de modo acachapante, contrariarem norma de ordem pública.

 Suponha que um bandido tenha escrito em suas diretivas:

– Se eu vier a ser interditado, quero que o curador continue me levando para acompanhar a realização de assaltos.

Essa Diretiva não pode ser cumprida. Isso, porque o princípio da vontade presumível da pessoa vulnerável pode ceder diante de outros valores que, no caso concreto, sejam considerados mais relevantes.

O juiz tem de ser extremamente cuidadoso com essa última hipótese, restringindo-a a situações de manifesta ilegalidade. Diretivas de Vontade excêntricas, heterodoxas ou até mesmo repugnantes não devem necessariamente ser afastadas, ainda que sejam de baixa aceitação social, porque a dignidade da pessoa humana pressupõe garantir que cada indivíduo decida livremente o próprio percurso. O Direito tem de assegurar, ao máximo, a liberdade de cada um ser o que quiser, desde que isso não configure manifesta ilegalidade.

Sob essa ótica, as Diretivas de Curatela assemelham-se ao testamento, por ser uma espécie de disposições de última vontade da pessoa. É a manifestação da vontade dela enquanto lhe era possível lucidamente externar a vontade. Como, após a perda de lucidez, não há como a pessoa mais expressar a sua vontade, é forçoso prestigiar – ao máximo – as suas Diretivas de Vontade. Por esse motivo, entendemos que, por analogia, é possível aplicar às Diretivas de Curatela o princípio da vontade soberana do testador, segundo o qual a vontade do testador deve ser, ao máximo, respeitada[8].

A terceira situação que afastaria as Diretivas de Curatela é a falta de condições materiais. Se não há recursos materiais suficientes para cumprir as Diretivas de Curatela, infelizmente a pessoa vulnerável não poderá ter suas diretivas atendidas.

Se ela, por exemplo, queria ser levada a Paris anualmente caso fosse interditada, isso talvez não possa ser cumprido por questão de viabilidade material (ex.: ausência de dinheiro; falta de estrutura logística para cuidar da pessoa vulnerável na viagem; etc.).

2.3. Cláusula de Pró-labore ao curador

É preciso tomar cuidado no controle judicial sobre cláusulas das Diretivas de Curatela que estabeleçam remunerações ao curador. Não deve o juiz interferir na Diretivas, salvo no caso de insuficiência financeira.

Se, por exemplo, as Diretivas de Curatela indicam o teto do funcionalismo público com pró-labore, não cabe ao juiz reduzir esse valor, salvo se não houver dinheiro suficiente para tanto.

De fato, remunerações maiores poderão significar maior conforto para as pessoas vulneráveis, uma vez que os curadores poderão dedicar parte significativa do seu tempo para os deveres da curatela e, por consequente, poderão abrir mão de desenvolver projetos profissionais pessoais.

Além do mais, assumir a curatela de uma pessoa interditada não costuma, do ponto de vista estritamente financeiro, ser atraente.

O curador, na prática, precisa voltar toda a sua atenção para a pessoa vulnerável, velando por questões patrimoniais e também existenciais.

Até cuidados básicos, como o de alimentação e de higiene, estarão no radar do curador. Mesmo quando o curador estiver fisicamente longe do curatelado, sua preocupação não poderá se distanciar.

Assim, eventual remuneração fixada judicialmente em favor do curador dificilmente compensaria, do ponto de vista financeiro, essa dedicação em tempo integral que a curatela exige. Curador não é regido pela CLT, não tem limite de horas de trabalho, não tem direito a férias etc. O curador assume uma missão, e não um simples trabalho.

O principal mote que levaria alguém a assumir a curatela é o vínculo afetivo com a pessoa incapaz. O amor conduz o ser humano a se sacrificar, a suportar, a abnegar-se, a tudo. Na consagrada descrição paulina, o amor “não maltrata, não procura seus interesses, (…) tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (I Co 13.4-7).

O Direito, com sua estrutura assentada na coerção, sabe de sua impotência para obrigar alguém a amar. No máximo, em alguns casos, ele pode obrigar alguém a se comportar como se amasse, ainda que não ame de verdade. Mas, no mais das vezes, essa tentativa será malograda: o Direito não resolve todos os problemas da sociedade.

Seja como for, uma boa remuneração poderá encorajar mais o curador a caprichar no cuidado do curatelado, ainda mais se levarmos em conta as altas cifras cobradas por entidades que, de forma profissional, oferecem serviços de cuidados para pessoas incapazes (como as famosas “casas de repouso”).

Os preços desses serviços não costumam ser amigáveis. É sabido que algumas entidades chegam a cobrar mais de vinte mil reais mensalmente, o que dá uma noção econômica dos serviços prestados pelos curadores.

Cabe um alerta: a colocação da pessoa vulnerável em uma entidade profissional deve ser vista última alternativa, pois, para o homo medius, o ideal é que seus momentos de vulnerabilidade sejam coloridos com o afeto dos seus.

2.4. Cláusula de rejeição de potenciais curadores e cláusula de indicação de profissional

Eventualmente, por uma questão íntima, a pessoa pode manter um ambiente de desavença com um filho ou com outro parente. Essa tensão talvez seja inviável de provar em juízo, por não ser externada por meio de atos concretos.

É o caso daquele empresário que mencionamos no início do texto. Ele mantém forte distância afetiva em relação a um determinado filho, que, infelizmente, só demonstra desprezo contra o pai.

Nessas hipóteses, as Diretivas de Curatela poderiam se resumir a prever a vontade de que, em hipótese alguma, esse filho deveria ser nomeado como curador.

Poderia ser dito que, no caso de interdição, seria preferível a internação em alguma casa de repouso ou a nomeação de um profissional como curador.

No caso de se preferir a nomeação de um profissional, a pessoa poderá indicar como gostaria que a curatela fosse exercida. Poderia, por exemplo, ser estabelecido que o curador deveria velar para que o curatelado: (1) ficasse morando em um determinado hotel ou em uma determinada casa, ainda que sob assistência de algum enfermeiro ou outro profissional; (2) fosse levado semanalmente a um determinado local de sua preferência, como algum teatro ou algum encontro devocional de sua religião. Também poderiam ser dados comandos quanto à gestão financeira, com indicação do que se deve comprar, o que se deve doar etc. também se poderia indicar a remuneração a ser paga ao curador, não cabendo ao juiz questionar o valor indicado (por mais alto que possa parecer). Afinal, quanto mais alta a remuneração, maior tenderá ser a qualidade dos serviços. Caberá ao curador – dentro do que for possível, cumprir todas as Diretivas de Curatela.

É conveniente que a motivação dessa cláusula seja exposta nas Diretivas de Curatela, por mais íntima que seja. Por exemplo, aquele empresário que mencionamos deveria explicar seu histórico conturbado de relacionamento com o filho e explicar o porquê de não querer jamais que esse filho seja seu curador. Essa motivação reduziria os riscos de uma decisão judicial que desconsiderasse essas Diretivas, considerando-as desatualizadas.

Eventualmente, a pessoa indicada pode recusar-se a assumir a curatela ou pode já ter morrido. Nesse caso, as Diretivas de Curatela deverão ser tomadas pelo juiz como um elemento probatório para, no caso concreto, buscar a solução mais compatível.

Suponha-se, por exemplo, que as Diretivas de Curatela indicavam um amigo como curador e denegriam a reputação dos familiares biológicos da pessoa vulnerável. Se o amigo não puder ou não quiser assumir a curatela, parece-nos que o mais adequado seria designar algum curador profissional (como alguma instituição) de padrão econômico compatível com o patrimônio da pessoa vulnerável. Não se deveria entregar a curatela a nenhum familiar biológico, tudo em respeito às Diretivas de Curatela.

3. Necessidades de aprimoramento

3.1.         Clareza textual no Código Civil

O Código Civil deveria ser mais textual na definição da ordem preferencial supracitada de curadores bem como no reforço da liberdade da pessoa em indicar como será a curatela, além de outros esclarecimentos de pontos indicados neste texto.

É que o laconismo do texto legal acaba por, em um país continental como o nosso, colaborar para a existência de posicionamentos diferentes entre os juízes brasileiros.

3.2.        Aparato estatal de efetividade das Diretivas

É forçoso reconhecer a pouca efetividade da curatela autêntica, aquela que consiste no respeito à indicação do curador pela própria pessoa vulnerável antes de sua obnubilação. Essa falta de efetividade decorre da falta de um aparato estatal capaz de dar a devida publicidade à indicação da pessoa vulnerável.

Pense em uma pessoa que escreva em um papel o seguinte:

– caso eu perca a lucidez, quero que meu amigo Fulano seja o curador.

Suponha que ele assine e reconheça a firma nesse papel, o que tornará esse documento autêntico (art. 411, I, do CPC[9]).

Se, futuramente, essa pessoa vier a perder a lucidez, a tendência é que o processo de interdição corra sem qualquer notícia daquele papel, que ficará na escuridão de alguma gaveta da casa da pessoa vulnerável ou na sombra do esquecimento de algum conhecido a quem o documento tivesse sido noticiado.

Aliás, a depender do teor do documento, alguém parente de má-fé que se sinta prejudicado poderá vir a destruir esse documento.

Em outras palavras, apesar de a lei prestigiar a vontade da pessoa em indicar quem seria seu curador no caso de perda da lucidez, a realidade prática é de baixíssima efetividade dessa regra.

Por essa razão, entendemos que urge criarmos um aparato estatal capaz de dar efetividade a esse direito fundamental dos indivíduos em preordenar quem será seu curador e em indicar como será exercida a curatela.

Esse aparato estatal deve ser extrajudicial, estribado no protagonismo dos cartórios.

Pode-se tomar por parâmetro a notável experiência dos tabeliães de notas em relação aos testamentos públicos. Para evitar que, após a morte, o testamento público fique na escuridão, os tabeliães de notas mantêm, na sua central, informações de todos os testamentos públicos lavrados no País. Trata-se da CENSEC (Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados), fruto do protagonismo proativo do Colégio Notarial do Brasil e calcado no Provimento CNJ nº 18, de 28 de agosto de 2012. Na CENSEC, há o módulo operacional do RCTO (Registro Central de Testamentos On-Line), o que serve para a finalidade ora enfocada.

Ocorrendo a morte de uma pessoa, o inventário dela fica condicionado à prévia consulta à RCTO/CENSEC sobre a existência ou não de um testamento público. Di-lo o Provimento CNJ nº 56, de 14 de julho de 2016. Essa solução garante, de um lado, o sigilo dos testamentos públicos, porque terceiros não podem tomar ciência do testamento antes da morte do testador. E, de outro lado, garante a efetividade no respeito ao testamento, porque nenhum inventário pode ser realizado sem prévia consulta à central dos tabeliães. Infelizmente, isso só vale para testamentos públicos ou cerrados. Os testamentos particulares não gozam do mesmo prestígio e correm o risco de ficarem na escuridão. Aliás, entendemos que deveria ser criada uma central para informações destinadas à identificação da localização (e até mesmo do teor) de testamentos particulares.

Voltando ao caso da curatela autêntica, entendemos que, por ato do CNJ (ou, até mesmo, por lei), os tabeliães de notas deveriam abastecer a central com notícia de todas as escrituras públicas de “diretivas de curatela”, as quais ficariam sob sigilo até eventual interdição da pessoa. Só a própria pessoa poderia obter certidões dessa escritura, visto que o seu conteúdo é extremamente íntimo e potencialmente prejudicial às relações pessoais da pessoa (à semelhança do testamento). Somente quando vier a ocorrer a interdição da pessoa, o juiz deverá consultar a central dos tabeliães para obter a certidão da escritura pública de “diretivas de curatela”.

A elaboração das Diretivas de Curatela por escritura pública é o ideal, porque o notário é o profissional do Direito habilitado a formalizar a vontade das pessoas.

Se, porém, a pessoa quiser usar outra forma para as suas Diretivas de Curatela – como um instrumento particular ou uma declaração por meio de um documento nato-digital -, não há obstáculos a tanto.

Seria recomendável (mas não obrigatório) o reconhecimento de firma nesses documentos particulares (inclusive nos eletrônicos) para afastar o risco de falsidades.

A pessoa poderá deixar esse instrumento aos cuidados de alguém de sua confiança, que pode ser até mesmo um profissional especializado em prestar esse serviço. Caberá a esse depositário exercer um papel similar ao do testamenteiro: velará para que as Diretivas de Curatela sejam observadas e, por isso, monitorará se vier algum processo de interdição e apresentará ao juiz o instrumento das Diretivas. 

Outra alternativa é permitir o registro do instrumento particular das Diretivas no Cartório de Registro de Títulos e Documentos (RTD), caso em que este deverá assumir os deveres análogos do tabelião (comunicar a central para informação ao juiz no caso de eventual interdição).

Para evitar discussões sobre a desatualização das Diretivas de Curatela, é recomendável que, anualmente, a pessoa ratifique o seu ato.

Uma forma poderia ser por meio de algum convênio com a Receita Federal, a fim de permitir que, na própria declaração de imposto de renda, a pessoa ratifique as Diretivas de Curatela lá especificada.

Outra forma seria por meio de uma espécie de instrumento aditivo de ratificação. Se as Diretivas de Curatela tiverem sido lavradas por escritura pública, os tabeliães, eletronicamente, poderiam comunicar anualmente a pessoa sobre a conveniência da ratificação, a qual poderia ser feita também eletronicamente, com o pagamento dos devidos emolumentos. Se, porém, as Diretivas tiverem sido feitas por instrumento particular, esse papel poderia ser feito pelo RTD (se tiver havido o registro do instrumento particular) ou pela pessoa ou profissional de confiança.

3.3.        Soluções privadas: o “anjo da guarda”

Embora não se tenha notícia de muitas atividades privadas nesse sentido, uma alternativa é contratar o que chamaremos de um “anjo da guarda”.

Esse “anjo da guarda” poderia ser uma empresa ou um escritório de advocacia que se incumbiria de monitorar, periodicamente, a pessoa a fim de identificar a sua condição de lucidez. Esse monitoramento poderia ser feito por meio de reuniões (ainda que virtuais) com a pessoa anualmente. Ela também guardaria as Diretivas de Curatela como uma verdadeira depositária e colheria, periodicamente, um aditivo de ratificação a fim de manter sempre atualizada a vontade da pessoa.

Caso eventualmente seja identificada a perda da lucidez, o “anjo da guarda” se incumbiria de adotar as medidas necessárias à interdição e ao respeito às Diretivas da Curatela.

O ideal, porém, é que sejam feitas as alterações normativas indicadas no capítulo anterior, a fim de que, na prática, o Estado atue como “anjo da guarda” por meio de seus braços, como os serviços notariais e registrais.

CONCLUSÕES

Em suma, podemos concluir o seguinte:

a) O princípio da vontade presumível é uma diretriz a ser seguida pelo juiz, pelo Ministério Público e por todos os atores públicos ou privados que vierem a lidar com pessoas vulneráveis (subseção 1.3.).

b) A depender do caso concreto, em respeito à vontade presumível e à vontade real, pode-se adotar restritivas de regras do Código Civil acerca da curatela, a exemplo das regras de proibição de atos de liberalidade (subseção 1.3).

c) A ordem de preferência entre as diferentes espécies de curatela quanto à origem é esta: curatela autêntica, curatela legítima e curatela dativa (subseção 1.4.).

d) “Diretivas de Curatela” é o documento por meio do qual a pessoa declara qual é sua vontade caso venha a ser submetida a curatela no futuro. Nas Diretivas de Curatela, a pessoa apontará quem deverá ser nomeado curador (curatela autêntica), qual remuneração será devida a ele e como o curatelado deverá ser cuidado (subseção 2.1.).

e) Por essa razão, a regra é a de que as Diretivas de Curatela devem ser observadas, ao máximo, pelo juiz e pelo curador em favor da pessoa vulnerável. Há três principais exceções: (1) existência de elementos concretos que, de modo inequívoco, indiquem a desatualização das Diretivas de Curatela; (2) manifesta violação a normas de ordem pública; e (3) inviabilidade material (subseção 2.2.).

f) É preciso tomar cuidado no controle judicial sobre cláusulas das Diretivas de Curatela que estabeleçam remunerações ao curador. Não deve o juiz interferir na Diretivas, salvo no caso de insuficiência financeira (subseção 2.3.).

g) São admissíveis, nas Diretivas de Curatela, a cláusula de rejeição de potenciais curadores e a cláusula de indicação de profissional (subseção 2.4.).

h) O Código Civil deveria ser mais textual na definição da ordem preferencial supracitada de curadores bem como no reforço da liberdade da pessoa em indicar como será a curatela, além de outros esclarecimentos de pontos indicados neste texto (subseção 3.1.).

i) Convém a edição de norma do Conselho Nacional de Justiça para dar efetividade às Diretivas de Curatela (subseção 3.2.).

j) Embora não se tenha notícia de muitas atividades privadas nesse sentido, uma alternativa para dar efetividade às Diretivas de Curatela é contratar o que chamamos de um “anjo da guarda” (subseção 3.3.).

 

Referências bibliográficas

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, v. 6: Direito de Família. São Paulo: SaraivaJur, 2023.

OLIVEIRA, Carlos E. Elias; COSTA-NETO, João. Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense/Método, 2023.

OLIVEIRA, Carlos Eduardo Elias de Oliveira. O Princípio da Vontade Presumível no Direito Civil: fundamento e desdobramentos práticos.(Texto para Discussão nº 314). Disponível em: <www.senado.leg.br/estudos>. Acesso em: 5 de mar. 2018. Brasília: Núcleo de Estudos e Pesquisas/CONLEG/Senado, março, 2023.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2023.

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[1] Por questão didática, fizemos alguns ajustes fáticos, sem, porém, comprometer a essência das histórias.

[2] Art. 1.749. Ainda com a autorização judicial, não pode o tutor, sob pena de nulidade:

I – adquirir por si, ou por interposta pessoa, mediante contrato particular, bens móveis ou imóveis pertencentes ao menor;

II – dispor dos bens do menor a título gratuito;

III – constituir-se cessionário de crédito ou de direito, contra o menor.

Art. 1.781. As regras a respeito do exercício da tutela aplicam-se ao da curatela, com a restrição do art. 1.772 e as desta Seção.

[3]  Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…) III – a dignidade da pessoa humana;

[4] Art. 178. O Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam: (…) II – interesse de incapaz;

[5] OLIVEIRA, Carlos Eduardo Elias de. O princípio da vontade presumível no Direito Civil: fundamento e desdobramentos práticos. Brasília: Núcleo de Estudos e Pesquisas/CONLEG/Senado. Disponivel em: www.senado.leg.br/estudos. Acesso em 18 de janeiro de 2023.

[6] Ensina Flávio Tartuce: “Quanto à origem, a tutela é dividida em três categorias. A primeira delas é a tutela testamentária, instituída por ato de última vontade, por testamento, legado ou mesmo por codicilo (art. 1.729, parágrafo único, CC/2022). (…). Como segundo categoria, a tutela legítima é a oconcretizada na falta de tutor nomeado pelos pais, nos termos do art. 1.731 do CC/2002 (…) Por fim, há tutela dativa, presente na falta de tutela testamentária ou legítima (…).” (TARTUCE, Flávio. Direito Civil: direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2023, p. 702).

[7] GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, v. 6: Direito de Família. São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 689.

[8] Oliveira, Carlos E. Elias de Oliveira; COSTA-NETO, João. Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense/Método, 2023, p. 1.517.

[9] Art. 411. Considera-se autêntico o documento quando:

I – o tabelião reconhecer a firma do signatário;

II – a autoria estiver identificada por qualquer outro meio legal de certificação, inclusive eletrônico, nos termos da lei;

III – não houver impugnação da parte contra quem foi produzido o documento.