A Vara de Família de Caxias/MA julgou procedente um pedido de reconhecimento de dupla maternidade de uma criança gerada através da “inseminação artificial caseira”.
Entendam o caso. Um casal formado por duas mulheres resolveu ter um filho e para isso lançou mão da “inseminação artificial caseira”, técnica através da qual o esperma doado é introduzido na mulher por meio de seringa, sem qualquer contato físico entre o doador e a receptora.
Após o nascimento da criança elas buscaram o judiciário para registrá-la como sendo filha das duas – biológica de uma e socioafetiva da outra.
Apesar de ser um tema bastante polêmico e as decisões ainda serem incipientes em nossa jurisprudência, a inseminação caseira conta com milhares de adeptos no país, que se relacionam através das redes sociais e tem como regra, o anonimato dos participantes.
A sentença teve como fundamentos o afeto e a pluralidade de arranjos familiares, vindo para preencher uma lacuna legislativa, bem assim para reafirmar que o Estado-juiz não pode permanecer inerte e indiferente às mudanças sociais pertinentes às questões familiares, porquanto, não raras vezes, a norma corre atrás da dinâmica das relações interpessoais e seus consectários.
O servidor Elton Costa – familiarista e especialista em família e sucessões – a quem incumbiu minutar a decisão, definiu a sentença “como a efetivação, na prática, da tutela jurisdicional protetiva do afeto e da pluralidade das conformações familiares, bem assim que não podemos olvidar, jamais, das situações reais vivenciadas pelas pessoas, tampouco ignorar as consequências jurídicas dessas relações. O Direito das Famílias não se revela contemplativo quando observado tão somente sob a fria letra da lei, muito menos sob a gélida ótica da sua ausência. O fato de não existir regramento legal que ampare a inseminação artificial caseira não pode servir como fundamento para que as famílias originadas deste procedimento sejam impedidas de receber o seu devido amparo jurídico. Em suma, família é amor, é afeto, é busca pela felicidade dos seus integrantes e não nos cabe – sociedade e/ou Estado-juiz – questionar de que modo ela se configura”.
Nas palavras do magistrado titular da vara, Dr. Antônio Manoel Araújo Velôzo: “O Direito é um fenômeno cultural histórico e, portanto, mutável. O fenômeno jurídico está sujeito a mutabilidade de conceitos sociais e necessita estar antenado às alterações dos costumes e ditames morais. Nesse sentido, o conceito de paternidade ou de maternidade, atualmente, não se relaciona exclusivamente com a questão sexual heterodoxa. A sentença ora publicada atendeu a um reclame dos nossos tempos – a denominada inseminação artificial caseira – reafirmando que parentalidade é afeto, amor e função“.
Veja a sentença no nosso Telegram “O Civilista”.
Fonte: Elton Costa Vara de Família de Caxias – MA.