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Vitor Guglinski
Pós-graduado com especialização em Direito do Consumidor pela Universidade Estácio de Sá (UNESA). Professor dos cursos de pós-graduação da Universidade Cândido Mendes Ipanema (RJ), do Meu Curso (SP), do Centro de Estudos em Direito e Negócios – CEDIN (MG) e da Escola Superior de Advocacia da OAB Nacional. Membro associado do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon). Autor de obras jurídicas. Ex-assessor jurídico do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Advogado.
vitor.guglinski@gmail.com
RESUMO
O estudo que ora se apresenta tem por objetivo refutar os argumentos comumente utilizados pelo Poder Judiciário para afastar o direito à compensação por dano moral nas relações de consumo. Precisamente, critica-se, por absoluta ausência de critérios científicos e, consequentemente, em razão da carga subjetiva que os cerca, os argumentos do enriquecimento sem causa, da existência de uma suposta “indústria” do dano moral e, finalmente, a argumentação no sentido de que as lesões causadas aos consumidores são meros aborrecimentos próprios da sociedade de consumo de massa. Para fundamentar o que ora se sustenta, este autor recorreu às bases constitucionais e legais do ordenamento jurídico brasileiro, corroborado por autorizada doutrina consumerista e um estudo realizado no âmbito das ciências econômicas. Buscou-se, afinal, reforçar-se a necessidade de uma mudança de mentalidade dos operadores do direito em torno da infeliz tríade: indústria do dano moral/enriquecimento sem causa/mero aborrecimento, a qual, aliada à ineficiência do Estado em todas as suas esferas, ao descaso, à incompetência e, mesmo por vezes, à má-fé do fornecedor, tem sido responsável pela ausência de resposta adequada e eficaz às inúmeras violações aos direitos dos consumidores no Brasil.
ABSTRACT
The present study aims to refute the arguments commonly used by the Courts to rule out the right to compensation for moral damage in consumer relations. Precisely, it is criticized, due to the absolute absence of scientific criteria and, consequently, due to the subjective burden that surrounds them, the arguments of unjust enrichment, the existence of a supposed “industry” of moral damage and, finally, the argument in the that injuries to consumers are mere annoyances of the mass consumer society. To substantiate what is now supported, this author resorted to the constitutional and legal bases of the brazilian legal system, corroborated by authorized consumerist doctrine and a study carried out in the scope of economic sciences. After all, it was sought to reinforce the need for a change in the mentality of the operators of law around the unfortunate triad: industry of moral damage / enrichment without cause / mere annoyance, which, together with the inefficiency of the State in all spheres, neglect, incompetence and, even sometimes, the supplier’s bad faith, has been responsible for the lack of an adequate and effective response to the numerous violations of consumer rights in Brazil.
Sumário: 1. Introdução. 2. A imprecisão do argumento do enriquecimento sem causa e a falaciosa tese sobre a existência de uma “indústria” do dano moral. 3. Crítica ao argumento do mero aborrecimento. 4. Conclusão. 5. Referências bibliográficas.
1. Introdução
Foi com a entrada em vigor da Carta Republicana de 1988 que a reparabilidade do dano moral ganhou previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro, constando como direito fundamental nos incisos V[1] e X[2] do respectivo art. 5º. Antes, passou-se pela fase da irreparabilidade dessa espécie de dano, em que se afirmava ser inestimável a dor moral, e até mesmo se considerar imoral atribuir um preço à dor[3], e apenas em casos pontuais deferia-se compensações por dano moral com base no art. 156 do Código Civil de 1916[4].
Na ordem infraconstitucional – e nos estritos limites deste trabalho, isto é, sem ignorar outros diplomas legais que também passaram a disciplinar textualmente a compensação por dano moral -, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) foi o primeiro diploma normativo a prever expressamente a prevenção e reparação de danos morais como direito básico do consumidor, em conformidade com o disposto nos incisos VI[5] e VII[6] do seu art. 6º. Anos mais tarde, foi a vez do Código Civil em vigor (Lei 10.406/02) incorporar tal previsão no seu art. 186[7].
A expressa previsão normativa da reparação do dano moral no ordenamento jurídico brasileiro, aliada ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, implícito no inciso XXXV, do art. 5º, da CRFB/88[8] e à superveniência da Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95), favoreceram o acesso ao Poder Judiciário, que antes praticamente se restringia àqueles que dispunham de capacidade financeira para suportar o alto custo de um processo judicial. Consequentemente, o maior acesso à Justiça possibilitou a busca pela reparação de danos morais perante o Judiciário.
Porém, após as reparações começarem a ser deferidas pelo Poder Judiciário, os fornecedores que suportavam as condenações – principalmente os grandes conglomerados econômicos – criaram o argumento de que o número de processos envolvendo pedidos de compensação por danos morais demonstrava que havia se instituído o que se convencionou chamar de “indústria do dano moral”.
A respeito de expressões como “indústria do dano moral”, “indústria da responsabilidade civil” etc., Sergio Cavalieri Filho discorda de tais epítetos, ressaltando que “não há indústria sem matéria-prima, de sorte que se hoje os casos judiciais envolvendo responsabilidade civil são tão numerosos, é porque ainda mais numerosos são os casos de danos injustos”[9].
Em sentido semelhante, Edson Nelson Ubaldo expõe que a existência de uma suposta “indústria do dano moral” contaminou parte da magistratura, reforçando o argumento de magistrados mais conservadores que, por razões ideológicas, – inclusive de fundo religioso – nunca viram com bons olhos o novo instituto jurídico, ao mesmo tempo em que acabou inibindo magistrados mais liberais (ou justos?), cujas sentenças passaram a ser reformadas pelas instâncias superiores para diminuir os valores fixados[10].
Sobre o número de ações cujo objeto envolve pedidos relacionados a violações das normas de proteção e defesa do consumidor, Marié Miranda denuncia a responsabilidade do Estado pelos retrocessos contemporâneos em matéria de proteção e defesa do consumidor. Na esfera do Poder Executivo, a autora aponta deficiências que vão desde a ineficiência dos órgãos de regulação, ao disciplinar e fiscalizar inúmeros setores de atuação de fornecedores no mercado de consumo (aviação civil, telefonia, energia elétrica, atividade financeira, saúde suplementar etc.). Já no âmbito do Poder Legislativo, destaca a omissão das Casas Legislativas em relação à apreciação de matérias que são objeto de projetos de lei envolvendo direitos do consumidor. Por fim, quanto ao Poder Judiciário, elenca desde a edição de súmulas que discriminam o consumidor em contratos bancários até a indevida flexibilização das normas do Código de Defesa do Consumidor, com a validação de cláusulas abusivas em contratos de consumo, tachando as mais variadas violações aos direitos do consumidor como mero aborrecimento[11].
As mesmas causas de retrocessos apontadas pela autora acima citada também são identificadas por Dennis Verbicaro, João Vitor Penna e Silva e Pastora do Socorro Teixeira Leal, que atribuem à involução legislativa e ao abstencionismo estatal, no âmbito da atividade regulatória, a responsabilidade pelo estado de coisas em que se encontra a tutela do consumidor no Brasil, chegando a acusar o Estado de ser complacente com o ilícito[12].
Lamentavelmente, mesmo após 30 anos de vigência de um dos códigos mais modernos do mundo em matéria de proteção e defesa do consumidor; em que pese todos os dados que, diariamente, demonstram as constantes violações aos direitos desse sujeito presumidamente vulnerável – e em outros casos até mesmo hipervulnerável – da relação de consumo; apesar da robusta e qualificada produção doutrinária que, diuturnamente, hauri os maiores e melhores esforços em prol da defesa do consumidor, o argumento da existência de uma suposta “indústria” do dano moral permanece intacto no imaginário daqueles que enxergam nas normas consumeristas um exacerbado paternalismo e um óbice ao desenvolvimento econômico. Paralelamente, nos dias atuais também ganha força o fundamento de que as inúmeras ofensas aos direitos da personalidade, especialmente na esfera das relações de consumo, constituem “mero aborrecimento” resultante da complexidade das relações da vida moderna e, portanto, indignas de reparação civil.
Entretanto, ao longo deste trabalho, e por meio dele, buscaremos reforçar a necessidade de uma mudança de mentalidade dos operadores do direito em torno da infeliz tríade – indústria do dano moral/enriquecimento sem causa/mero aborrecimento, a qual, aliada à ineficiência do Estado em todas as suas esferas, ao descaso, à incompetência e, mesmo por vezes, à má-fé do fornecedor, tem sido responsável pela ausência de resposta adequada e eficaz às inúmeras violações aos direitos dos consumidores no Brasil.
2. A imprecisão do argumento do enriquecimento sem causa e a falaciosa tese sobre a existência de uma “indústria” do dano moral
Carece de base científica o argumento no sentido de que atribuir-se à compensação por dano moral um valor considerável e condizente com a extensão do dano suportado pela vítima acarreta seu enriquecimento sem causa. Ao contrário, as próprias acepções dos vocábulos rico e enriquecer, e dados colhidos em estudos científicos mostram exatamente o contrário – que, em regra, eventual soma pecuniária reparatória não é capaz de enriquecer ninguém.
Amanda Flávio de Oliveira afirma ser insustentável a lógica da tese sobre a existência de uma “indústria do dano moral”, uma vez que, no seu entendimento, há uma inversão de valores em que, ao invés de se presumir a boa-fé nas relações humanas e jurídicas de consumo, pressupõe-se a má-fé da vítima[13].
Ao ponderar sobre a tese do enriquecimento sem causa, Edson Nelson Ubaldo questiona essa linha de argumentação, afirmando não haver um significado exato do verbo enriquecer, o qual é compreendido conforme critérios absolutamente subjetivos por cada magistrado, fazendo com que haja uma confusão entre a pequena melhoria de vida da vítima, proporcionada pela compensação pecuniária, com o temido enriquecimento sem causa, “como se algumas poucas dezenas ou mesmo centenas de salários pudessem enriquecer alguém”[14].
Roberto Oleiro Soares também contribui para rechaçar o argumento do enriquecimento sem causa como fundamento para a fixação do quantum compensatório por dano moral em valores irrisórios ou mesmo para a negativa de reparação em casos tais. Amparado em abalizada doutrina nacional e estrangeira, o autor tece críticas à inadequada utilização do instituto pelo Judiciário, destacando que “é a ausência de causa ou justificativa que faz incidir a vedação do enriquecimento sem causa, não o enriquecimento em si”. E arremata, registrando que a utilização atécnica da vedação do enriquecimento sem causa acaba desinibindo o ofensor a agir em conformidade com a lei, a qual continua violando[15].
Noutro giro, a própria função desempenhada pela reparação por dano moral depõe contra o argumento do enriquecimento sem causa. Flávio Tartuce ensina que não é função da reparação por dano moral promover um acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim compensá-la pelos males sofridos, não havendo sequer incidência de imposto de renda sobre esse valor[16]. Nessa linha, eventual verba deferida à vítima tem por escopo servir-lhe de lenitivo, suavizando, abrandando, mitigando os efeitos do dano. Tem-se, então, nesse contexto, outro argumento que demonstra a insustentabilidade do fundamento do enriquecimento sem causa para se negar a reparação das vítimas de dano moral.
Com efeito, para o Direito, a análise isolada dos vocábulos rico[17] e enriquecer[18] não soluciona o problema relacionado ao argumento do enriquecimento sem causa, na medida em que o enriquecimento há de ser observado levando-se em conta fatores socioculturais.
Argumento diverso, que talvez contribua para reforçar o coro contra a tese do enriquecimento sem causa, pode ser extraído da própria economia, cujo equilíbrio tantas vezes é questionado como aspecto passível de prejuízo, caso fossem deferidas indenizações em valores expressivos.
Com base no estudo intitulado “Atlas da Exclusão Social, Os Ricos no Brasil”, organizado pelo economista Márcio Pochmann, e que contou com a colaboração de 16 especialistas, Louis Frankenberg discorre sobre alguns aspectos que procuram definir o indivíduo considerado rico em nosso país[19].
Segundo Frankenberg, o estudo de Pochmann revelou que o censo de 2000 concluiu haver cerca de 1.162.000 famílias ricas no Brasil, representando 2,4% do total de aproximadamente 48.416.000 famílias existentes, sendo a média de ganhos dessas famílias calculada em R$ 10.982,00 mensais, e sem esquecer que esses dados significam que uma parcela deste grupo de 2,4% da população ganha acima e outro a abaixo deste valor médio. O autor suscita algumas dúvidas sobre as afirmações acima[20]:
“A primeira dúvida que coloco em relação aos dados coletados e sua interpretação é afirmar que quem ganha R$10.982,00 mensais não pode apenas por este único fato ser considerado rico. Pode isso sim, estar ganhando muito mais em relação às 97,6% restantes famílias do Brasil.
Assumindo que a família é constituída de 4 pessoas (casal mais dois filhos) e que somente uma delas recebe esta remuneração bruta mensalmente e de que 20% irá para o imposto de renda (sem falar de outras deduções como INSS, etc), a família de fato recebe em mãos R$ 8.785,00.
Esta família certamente pagará em média R$ 1.500,00 de instrução para seus filhos estudando em escola particular, terá um seguro saúde no valor R$ 500,00 mensais e gastará ainda em alimentação, habitação, transporte, etc. (…)
O ponto que desejo realçar é que com o citado ganho mensal, provavelmente não sobra nada para investir e portanto formar uma reserva e muito menos ter a possibilidade de investir na aquisição de um imóvel para a própria moradia, mesmo pagando suavemente algum empréstimo imobiliário!
Em virtude das colocações acima, questiono a afirmação de ser considerada rica, a família que ganha R$ 10.982 mensais.”
Pois bem, considerando-se até mesmo os valores reputados como relativamente elevados em relação à média, deferidos em raras situações às respectivas vítimas, é de se indagar: como é possível se falar em enriquecimento do ofendido?!
A nosso sentir, ainda que se considere que o valor médio de renda apurado por Pochmann seja padrão de riqueza, seria necessário, na época em que o estudo foi concluído, que o indivíduo auferisse mensalmente, e durante toda a sua vida, a quantia de R$ 10.982,00, para que fosse considerado rico.
Como, então, se falar em enriquecimento nos casos envolvendo dano moral?! Seria necessária uma indenização astronômica para que se pudesse falar em enriquecimento!
À vista do exposto, a resposta nos parece negativa, mormente considerando-se a ponderação de Roberto Oleiro Soares, no sentido de que, no caso de ofensas em massa, isto é, provocadas por fornecedores que são litigantes habituais no Judiciário brasileiro, o enriquecimento é, em verdade, do fornecedor, que, conhecedor do valor do potencial prejuízo que sofrerá com eventuais condenações, poderá se programar seu modo de agir e seguirá violando a lei[21].
Destarte, considerando-se o que foi tratado neste tópico, parece-nos que o argumento do enriquecimento sem causa é frágil para justificar os baixos valores fixados nas decisões judiciais no Brasil, sendo que algumas decisões, ressalvadas aquelas que efetivamente procuram compensar o dano, ao invés de repararem a ofensa, são capazes de ofender ainda mais a vítima dizendo, verdadeira e subliminarmente, que a honra humana nada vale aos olhos do Poder Judiciário brasileiro.
3. Críticas ao argumento do mero aborrecimento
Conforme exposto na parte introdutória deste estudo, paralelamente aos argumentos do enriquecimento sem causa, e da existência de uma suposta “indústria do dano moral”, outra justificativa utilizada por magistrados para negar a reparação dessa espécie de dano é afirmar que esse tipo de prejuízo à pessoa não passa de mero aborrecimento, percalço próprio da vida moderna, atribuído a fatos previsíveis e comuns do cotidiano.
Entretanto, não se pode concordar com essa fundamentação, especialmente quando é possível constatar que o tratamento das lesões em massa aos direitos dos consumidores é, em diversas ocasiões, matematicamente calculado pelos fornecedores que atuam no mercado de consumo.
Miguel Barreto analisa o argumento do mero aborrecimento à luz do chamado dano eficiente. O autor explica que ocorre dano eficiente quando, para o ofensor, é mais vantajoso arcar com eventuais indenizações do que adotar as cautelas necessárias para a prevenção dos danos. Ao negar um direito a uma coletividade, o litigante contumaz aufere lucro ou realiza economia que pode ser financeiramente representada pelo valor monetário do direito negado, multiplicado pelo número de indivíduos lesados[22].
A noção de dano eficiente é detalhada por César Fiuza, distinguindo-o do dano ineficiente:
“Fala-se, outrossim, em dano eficiente e dano ineficiente. Ocorre dano eficiente, quando for mais compensador para o agente pagar eventuais indenizações do que prevenir o dano. Se uma montadora verificar que uma série de automóveis foi produzida com defeito que pode causar danos aos consumidores, e se esta mesma empresa, após alguns cálculos, concluir ser preferível pagar eventuais indenizações pelos danos ocorridos, do que proceder a um recall para consertar o defeito de todos os carros vendidos que lhe forem apresentados, estaremos diante de dano eficiente. O dano ineficiente, por seu turno, é o dano eficiente tornado ineficiente pela ação dos órgãos administrativos do Estado e/ou do Judiciário. Na medida em que o juiz condenar a montadora a uma altíssima indenização, ao atuar em ação indenizatória proposta por um dono de automóvel, vitimado pelo dano causado pelo defeito de produção, estará transformando o dano eficiente em dano ineficiente. As eventuais indenizações que a montadora terá que pagar serão tão altas, que será preferível o recall, por ser mais barato.
A questão relativa ao dano ineficiente é equacionar duas questões. Por um lado, o valor da condenação há de ser alto, para que o dano seja de fato ineficiente para seu causador. Por outro lado, deve-se ter em conta que indenização não deve ser fonte de enriquecimento, mas de reparação de danos. O problema é de difícil solução, exigindo do juiz um enorme exercício de bom-senso e, às vezes, de coragem. O legislador poderia pôr fim ao dilema, editando norma, segundo a qual parte do valor da condenação iria para a vítima, a título de reparação pelos danos sofridos, enquanto a outra parte reverteria aos cofres públicos, sendo afetada à utilização em programas sociais.” (FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 11ª ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 720)
Para combater a tese do mero aborrecimento, a Ordem dos Advogados do Brasil lançou no ano de 2016 a campanha “Mero aborrecimento tem valor”[23], motivada pelos baixos valores fixados em condenações por dano moral, e por meio da qual se busca a conscientização da sociedade e da Justiça em relação à valorização das pequenas ações perante o Judiciário[24].
As pretensões envolvendo pedido de reparação de dano moral na contemporaneidade não devem ser consideradas como mero capricho, sensibilização exacerbada ou tentativa de se estabelecer uma “indústria” de ganhos fáceis. Analisando-se alguns julgados dos tribunais nacionais, é possível verificar que os órgãos julgadores que adotam a tese do mero aborrecimento tão somente declaram essa circunstância nas ementas e no bojo dos julgados, sem que haja maior aprofundamento no exame da matéria. Além disso, também se observa a insistência na já superada questão relacionada ao fato de o dano moral, necessariamente, implicar em dor, vexame, constrangimento, angústia etc.[25], muito embora esses efeitos sejam, de fato, sentidos pelas vítimas na maioria dos casos.
A identificação do que seja mero aborrecimento chega até mesmo a ser confusa. No julgamento do recurso inominado nº 71006996482[26], o respectivo relator do acórdão registrou que o tempo comprovadamente gasto pela consumidora para solucionar uma demanda junto a uma fabricante de computadores não pode ser tratado como mero aborrecimento do cotidiano, mas, por outro lado, não chega a configurar agravamento substancial da condição de vulnerabilidade técnico-jurídica do consumidor.
A preocupação com a consolidação do argumento do mero aborrecimento nos tribunais brasileiros também pode ser fomentada por recente julgado do STJ[27] em que foi decidido, inclusive com base em razões de fundo econômico[28], que não causa dano moral ficar 5 (cinco) dias sem energia elétrica – serviço essencial que deve ser prestado de forma adequada, eficiente, segura e contínua, conforme imperativo contido no art. 22 do CDC[29]. Tal decisão é emblemática a corroborar o que é dito por Verbicaro, Penna e Silva e Leal, no sentido de que é tenebroso o momento vivenciado no âmbito de sua proteção do consumidor[30].
No contexto da decisão acima citada, imagine-se um consumidor que sofre de diabetes, e por isso precisa manter sua insulina permanentemente refrigerada ou um consumidor enfermo que se trata no âmbito doméstico pelo sistema de home care, necessitando manter permanentemente ligado algum aparelho indispensável à manutenção de sua saúde; imagine-se uma consumidora que é mãe, e que sem energia elétrica vai precisar esquentar o ferro de passar roupa no fogão pra passar o uniforme escolar dos filhos, vai ter que lavar a roupa no tanque, mesmo tendo uma lavadora elétrica em casa. Exemplos não faltam para demonstrar o retrocesso que decisões como essa representam para o consumidor.
Ainda se considerando o exemplo acima, é de se indagar: o que, então, configura o dano moral nos dias atuais? Ficar sem energia elétrica por cinco dias seguidos, submeter-se ao stress e à irritação após realizar dezenas de ligações para o SAC de um fornecedor para simplesmente tentar cancelar um serviço, perder horas sendo desviado de atividades cotidianas por ineficiência do fornecedor, aguardar mais de 2 anos pela entrega de um imóvel[31], nada disso ofende a dignidade humana?! Nada disso viola os direitos da personalidade?!
Pois bem, a nosso sentir, e ao contrário do que vem sendo assentado na jurisprudência, aborrecimento há quando a expectativa de alguém é frustrada por acontecimentos imprevisíveis ou inevitáveis ou porque, afinal, a vontade dos envolvidos em uma tratativa não convergiram, quando a ida a uma festa é impedida porque está chovendo forte, quando não é conveniente frequentar determinados ambientes porque há alguma epidemia na cidade, quando o pneu do carro fura a caminho do trabalho; quando ficamos doentes; quando uma torneira velha que pinga insistentemente… Enfim, entendemos que pode se falar em aborrecimento quando sua causa é atribuída a um fortuito ou decorre de nossas próprias ações ou omissões. E mais: regra geral, o aborrecimento é algo passageiro, efêmero, de curta duração.
No âmbito das relações de consumo, que são essencialmente contratuais e travadas, em regra, para suprir necessidades existenciais, não se deve banalizar o argumento do mero aborrecimento, principalmente se for considerado que o fornecimento de produtos e serviços no mercado de consumo é realizado por fornecedores que exploram sua atividade na forma de empresa, articulando os chamados fatores de produção – capital, mão-de-obra, insumo e tecnologia[32]. São, portanto, sujeitos que, por definição legal etiquetada no art. 966 do Código Civil, atuam de forma profissional e organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços[33].
Com efeito, a ordem a ordem jurídica impõe ao fornecedor deveres jurídicos, isto é, decorrentes de normas imperativas. O aplicador do direito deve sempre se lembrar que o fornecedor desenvolve sua atividade no mercado de forma livre, profissional, visando o lucro e assumindo os respectivos riscos. Quanto a esse último aspecto – do risco – significa que o fornecedor está, ao mesmo tempo, sujeito ao sucesso e ao fracasso, e por isso há uma presunção relativa (juris tantum) de que está devidamente aparelhado para suportar eventuais prejuízos decorrentes de sua atividade, dentre os quais, logicamente, está compreendido o de ser eventualmente condenado a reparar os danos causados ao consumidor.
Entretanto, chegou-se a um lamentável estado de coisas em que o Judiciário, em diversas decisões[34], considera meros aborrecimentos cotidianos e previsíveis, próprios da vida moderna, os danos causados por fornecedores. Ou seja, hodiernamente ao consumidor é quase imposto o “dever jurídico” de prever que um sujeito que atua profissionalmente, por sua livre iniciativa, assumindo os riscos do empreendimento, e que, por isso mesmo, presumidamente, está (ou, no mínimo, deveria estar) devidamente aparelhado para resolver, a tempo e modo, as demandas envolvendo os produtos e serviços que coloca no mercado, poderá lhe causar um dano injusto, mas simplesmente sair impune porque é natural aborrecer outrem com sua incompetência, desídia, desorganização e, em muitos casos, verdadeira má-fé.
A respeito da afirmada previsibilidade dos aborrecimentos nas relações de consumo, julgamos pertinente outra indagação: o que o consumidor deve fazer para evitar esses aborrecimentos? Não consumir? Ou seja, numa sociedade essencialmente de consumo, deve o consumidor deixar de adquirir bens e contratar serviços para evitar ser “aborrecido” por quem, em tese, desenvolve atividades cuja missão implícita é tornar sua vida mais confortável?
Nesse contexto, precisas são as palavras de Bruno Miragem ao ponderar que “o Direito do Consumidor compreende, em si, também uma projeção da proteção da pessoa humana. Consumir é uma necessidade existencial, ninguém vive sem consumir. Logo, resguardar a integridade de cada pessoa é fazê-lo também na sua tutela como consumidora”[35].
A reforçar esse argumento, Adalberto Pasqualotto chama a atenção para o fato de que o consumidor não pode ser considerado apenas sob o aspecto econômico (homo oeconomicus), pois é sujeito dotado de dignidade, jamais devendo ser confundido com o objeto das relações de consumo[36]. Numa análise crítica do cenário das relações de consumo na atualidade, o mesmo autor conclui que “o consumidor, em geral, sofre três vezes: a) com a má prestação do fornecedor, no plano do negócio realizado; b) com a falta de consideração, quando procura o fornecedor pra reclamar; c) com a deficiência dos serviços institucionais quando procura o auxílio do Estado”[37].
Dentre as diversas frentes de combate ao argumento do mero aborrecimento como fundamento para a negativa de reparação por dano moral, atualmente tem se destacado a aplicação da teoria do Desvio Produtivo do Consumidor, desenvolvida por Marcos Dessaune, e que, desde seu debute na literatura jurídica, tem inspirado pesquisadores de todo o país a estudar e publicar trabalhos doutrinários que têm o chamado dano temporal como objeto de estudo. Na edição mais recente de sua obra, o autor informa a existência de quase mil decisões no âmbito dos tribunais estaduais em que a referida teoria foi aplicada para condenar fornecedores a reparar o dano moral causado a consumidores[38].
Na segunda edição de sua obra, em tópico especialmente dedicado à questão do mero aborrecimento, o autor em referência critica a expressão com base em três premissas: 1) o conceito de dano moral evoluiu, centrando-se hoje na ofensa a qualquer atributo da personalidade humana, abandonando-se, assim, a ideia da ocorrência de dor, sofrimento, humilhação, enfim, abalo psicofísico para que se verifique a lesão; 2) nas situações envolvendo desvio produtivo, importa tão somente observar a lesão ao tempo do consumidor e 3) o tempo do consumidor, embora não seja juridicamente tutelado de forma expressa, integra o rol de direitos da personalidade[39].
Como já tivemos a oportunidade de expor, dentro de uma interpretação sistemática, parece-nos que assiste razão aos autores que defendem que o tempo é, de fato, um bem passível de proteção jurídica, e, assim sendo, ante a ocorrência de sua subtração abusiva, indesejada pelo consumidor – seu titular –, presente estará o dever de reparar o dano decorrente de tal vilipêndio[40].
No âmbito da jurisprudência, cite-se
julgado recente da Vigésima Câmara cível do TJRJ[41], em que o órgão julgador afastou
a chamada “súmula do mero aborrecimento” daquele tribunal para aplicar a teoria
do Desvio Produtivo, tendo sido registrado já na ementa do julgado que “a súmula 75[42] do TJRJ não pode suprimir um direito que foi criado pela constituição
da república federativa do brasil, qual seja, o dano moral”.
Embora seja forçoso reconhecer que a reparabilidade do dano moral – especialmente a questão relacionada ao quantum compensatório – seja questão de difícil solução, pensamos que a utilização do argumento da ocorrência de mero aborrecimento ou dissabor próprios do cotidiano para se negar reparação a essa espécie de dano resulta em duas situações que não se afinam com uma ordem jurídica em que se busca a efetividade dos direitos fundamentais plasmados na Carta Fundamental de 1988: 1) ainda que no caso concreto se verifique que o dano moral suportado pelo consumidor não é de grandes proporções, ele ocorre de fato, porém não é reconhecido pelo Juízo que analisa a causa, e por isto o consumidor não recebe uma resposta do Estado a respeito de uma situação prejudicial à qual não deu causa ou para a qual não contribuiu e 2) como consequência, a ausência de resposta do Estado faz com que o fornecedor que causa dano moral ao consumidor se livre, de forma absoluta, de qualquer punição, o que, afinal, o encoraja a manter o mesmo comportamento no mercado de consumo, o que, afinal, se alinha com a noção de dano eficiente tratada por Miguel Barreto[43].
No quadro acima, então, percebe-se que o consumidor suporta a lesão sem qualquer resposta e o fornecedor sai impune. Tal situação nos remete à histórica lição de Beccaria, presente em sua célebre obra Dos Delitos e das Penas, no sentido de que o que importa não é o rigor do castigo que desestimula o ofensor a prosseguir violando a lei, mas a certeza do castigo, ainda que moderado[44].
Transportando-se a lição de Beccaria para o campo das relações de consumo – especialmente em relação ao fundamento do mero aborrecimento – é importante que o fornecedor seja punido pelo Estado, pois, ainda que num esforço se reconheça que a lesão ao consumidor é mínima, ainda assim é uma lesão, sendo que a ninguém é dado o direito de causar dano a outrem, ainda que mínimo. Alguma resposta deve ser dada pelo juiz.
Paralelamente, pensamos seja indispensável que os fornecedores se conscientizem sobre o importante papel que desempenham na sociedade, pois, é bom que se diga, a empresa – forma sob a qual, em regra, o fornecedor desenvolve sua atividade – possui relevante função social como fonte geradora de empregos, de desenvolvimento tecnológico, de produção e circulação de riquezas, mas que, não se olvide, tem os consumidores como seus principais sustentáculos (senão o maior deles). Então, é indispensável que desenvolvam sua atividades atentos aos preceitos éticos, segundo bem pontuado por João Baptista Herkenhoff, ao propor doze condições a serem observadas para que uma empresa seja considerada ética[45].
Numa palavra final, reforce-se que o consumidor é o sujeito vulnerável na relação de consumo e não o fornecedor. Como dito por Miragem, ninguém vive sem consumir. Por outro lado, lançar-se na atividade empresarial é uma opção de quem deseja empreender; decorre da livre iniciativa, que, segundo Pasqualotto, exercida em obediência à lei e à dignidade alheia, cumpre sua função social. Porém, havendo ofensa à dignidade do consumidor, o reequilíbrio se restabelece com a reparação pecuniária pelo juiz[46].
4. Conclusão
Conforme exposto neste estudo, embora a reparabilidade do dano moral encontre expressa previsão no ordenamento jurídico brasileiro, tanto de forma topográfica na Constituição Federal de 1988 quanto na ordem infraconstitucional, o Judiciário ainda nutre considerável antipatia por pretensões dessa natureza, negando a devida tutela jurisdicional, por entender que em diversas ocasiões a ofensa à dignidade do consumidor não passa de mero aborrecimento do cotidiano, próprio das relações complexas travadas na vida moderna, e que deferir as pretendidas reparações fomentaria uma suposta indústria do dano moral, além de promover o enriquecimento sem causa da vítima.
Viu-se, contudo, que inexistem bases científicas para se falar em indústria do dano moral e enriquecimento sem causa da vítima. A partir do conteúdo de respeitável doutrina jurídica, como também com base em dados obtidos em estudo de economia, é possível observar que os critérios utilizados pelo Judiciário para indeferir os pedidos de reparação civil por dano moral são subjetivos e imprecisos. Observa-se, ainda, uma inversão de valores no momento da apreciação de causas que têm como objeto a responsabilização civil do fornecedor por dano moral, consistente na tendência a se presumir a má-fé da vítima, sendo que, no sistema jurídico brasileiro, a presunção deve ser sempre no sentido de que as partes agem de boa-fé.
No tópico dedicado ao mero aborrecimento, foi visto que esse argumento correntemente utilizado pelos juízes para afastar o dever de indenizar o dano moral carece de força argumentativa a lhe dar suporte, ignorando-se a função social do consumo e a posição dos sujeitos dessa relação jurídica. Destacou-se a aplicação da moderna teoria do Desvio Produtivo do Consumidor pelos tribunais como um dos instrumentos de enfrentamento à chamada jurisprudência do mero aborrecimento e criticou-se a descabida insistência na superada questão relacionada aos reflexos anímicos do dano moral, isto é, a necessidade de identificação de sentimentos como dor, vexame, constrangimento, angústia etc., pois, como visto, atualmente o dano moral deve compreendido em seu sentido mais amplo, como ofensa à dignidade humana, dispensando-se a demonstração de sentimentos negativos e desagradáveis.
Finalmente, destacou-se que o dano moral, ainda que não gere de fato graves repercussões, merece resposta adequada por parte do Estado, sob pena de se estimular no fornecedor um indesejado sentimento de que vale a pena lesar o consumidor, em total desacordo com os preceitos éticos e jurídicos que devem governar a sociedade.
5. Referências bibliográficas
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[1] “V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.
[2] “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
[3] CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 91.
[4] ANDRADE, André Gustavo de. Dano Moral e Indenização Punitiva: Os Punitive Damages na Experiência do Common Law e na Perspectiva do Direito Brasileiro. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 8.
[5] “VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”.
[6] “VII o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados”.
[7] “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
[8] “XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
[9] CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Direito do Consumidor. 3ª ed. São Paulo: atlas, 2012, p. 286.
[10] A propósito do dano moral. Disponível em http://www.amc.org.br/portal/o_judiciario/2009/AMC200906.pdf. Acesso em 21/08/2018.
[11] MIRANDA, Marié. Movimento pelo fortalecimento de uma política nacional de defesa do consumidor – Conselho Federal da OAB – dia 14 de março de 2018. Contra os retrocessos no direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor, vol. 117, ano 27, p. 516-517. São Paulo: RT, maio-jun. 2018.
[12] VERBICARO, Dennis; PENA E SILVA, João Vitor; LEAL, Pastora do Socorre Teixeira. O mito da indústria do dano moral e a banalização da proteção jurídica do consumidor pelo Judiciário brasileiro. Revista de Direito do Consumidor, vol. 114, ano 26, p. 85. São Paulo: RT, nov-dez. 2017.
[13] A indústria do mero aborrecimento. Disponível em: http://www.oab.org.br/noticia/52130/artigo-a-industria-do-mero-aborrecimento. Acesso em 21/08/2018.
[14] Ibidem.
[15] SOARES, Roberto Oleiro. As funções punitiva e preventiva da responsabilidade civil nas relações de consumo. Belo Horizonte: Casa do Direito, 2018, p. 47.
[16] TARTUCE, Flávio. Direito Civil v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 417.
[17] rico – ri·co – adj sm Que ou aquele que possui muitos bens ou muito dinheiro; abastado, abonado, endinheirado; adj 1. Que tem algo em abundância; 2. Que pode produzir em grandes quantidades; 3. Que revela fausto e magnificência; faustoso, magnificente; 4. Que apresenta vários elementos diferentes; diversificado; 5. Que indica raridade; precioso, valioso; 6. Que apresenta vantagens materiais; vantajoso; 7 fig Que é fecundo em ideias ou imagens; fértil; 8. fig Que é muito querido; 9. fig Que apresenta ótima qualidade; excelente, muito bom; 10 fig Muito agradável; delicioso. Disponível em: https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/Rico/. Acesso em 21/08/2018.
[18] enriquecer – en·ri·que·cer – vtd, vint e vpr 1. Fazer ficar ou ficar rico; tornar(-se) rico ou opulento: “No seu tempo, o ouro brotava da terra com tal facilidade que enriqueceu pessoas e cidades” (CV1). Enriqueceu durante o destaque da Bolsa de Valores. Enriqueceu-se no mercado imobiliário. Vtd, vtdi e vpr 2. fig, por ext Tornar(-se) maior; aumentar, desenvolver(-se), melhorar: “[…] escritor-cientista, Ângelo Machado usa ciência para enriquecer seu universo ficcional” (AMa). Ele enriqueceu seu espírito com o curso de meditação. Seus conhecimentos enriqueceram-se com a leitura. Vtd 3. fig Tornar mais belo; abrilhantar, adornar, enfeitar, ornar: O bordado enriqueceu o vestido. Vtd 4. Tornar nobre; enobrecer. Disponível em: https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/Rico/. Acesso em 21/08/2018.
[19] Disponível em: http://www.administradores.com.br/noticias/negocios/quem-pode-ser-considerado-rico-no-brasil/485/. Acesso em 14/08/2018.
[20] Ibidem.
[21] Ibidem.
[22] BARRETO, Miguel. A Indústria do Mero Aborrecimento. 3ª ed. Juiz de Fora: Editar, 2016, p. 163.
[23] Disponível em: http://www.oab.org.br/noticia/52040/em-maceio-lamachia-lanca-campanhas-em-defesa-do-consumidor?argumentoPesquisa=mero%20aborrecimento. Acesso em 22/08/2018.
[24] A propósito das pequenas causas, Piero Calamandrei nos deixou insuperável lição, ao afirmar que “o bom juiz põe o mesmo escrúpulo no julgamento de todas as causas, por mais humildes que sejam. É que sabe que não há grandes e pequenas causas, visto a injustiça não ser como aqueles venenos a respeito dos quais certa medicina afirma que, tomadas em grandes doses, matam, mas tomadas em doses pequenas, curam. A injustiça envenena, mesmo em doses homeopáticas“. (CALAMANDREI, Piero. Eles, os juízes, vistos por nós, os advogados. São Paulo. Pillares, 2013, p. 224).
[25] A esse respeito, aprovado na V Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal, em parceria com o Superior Tribunal de Justiça, o enunciado nº 445, segundo o qual “o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos desagradáveis como dor ou sofrimento”. Disponível em: http://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/366. Acesso em 22/08/2018.
[26] No inteiro teor do acórdão, o relator do recurso assim concluiu seu voto: “Veja-se que o tempo que a autora despendeu nos inúmeros contatos com a requerida (comprovados através dos documentos que instruem a petição inicial), não podem ser tratado como mero aborrecimento do cotidiano, mas, por outro lado, não chegam a configurar agravamento substancial da condição de vulnerabilidade técnico-jurídica do consumidor, visto que isso ocorre quando o fornecedor, em reprovável conduta ou política institucional de consumo, ignora o reclamo do consumidor, nada faz para resolver o problema ou mesmo cria entraves infundados para a solução do problema. Ao que consta, houve tratamento ineficiente para a resolução do problema, mas isso não chega a configurar a imposição da compensação como forma de punir o fornecedor e compensar a impotência e frustração do consumidor”. (TJRS, Recurso Inominado 71006996482, Terceira Turma Recursal Cível, relator Juiz Fabio vieira Herdt, julgado em 26/04/2018)
[27] “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA PELO PRAZO DE 5 (CINCO) DIAS. DANO MORAL AFASTADO. 1. Ação ajuizada em 15/05/2013. Recurso especial concluso ao gabinete em 09/08/2017. Julgamento: CPC/2015. 2. O propósito recursal é definir se há dano moral a ser compensado pela recorrente em razão da interrupção do fornecimento de energia elétrica à residência do recorrido e demora no restabelecimento do serviço após temporal ocorrido no município. 3. A ausência de decisão acerca dos argumentos invocados pela recorrente em suas razões recursais, não obstante a oposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. 4. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. 5. A jurisprudência do STJ vem evoluindo, de maneira acertada, para permitir que se observe o fato concreto e suas circunstâncias, afastando o caráter absoluto da presunção de existência de danos morais indenizáveis. 7. Na espécie, não obstante admitida a responsabilidade da recorrente pelo evento danoso, a fixação do dano moral está justificada somente nos supostos transtornos causados pela falta de energia elétrica em sua residência, sem ter sido traçada qualquer nota adicional que pudesse ensejar a violação de direito de personalidade a ponto de causar grave sofrimento ou angústia, que caracteriza o dano moral. 8. Na hipótese dos autos, em razão de não ter sido invocado nenhum fato extraordinário que tenha ofendido o âmago da personalidade do recorrido, não há que se falar em abalo moral indenizável. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido”. (REsp 1705314/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/02/2018, DJe 02/03/2018)
[28] No inteiro teor do acórdão, a relatora registrou que “(…) admitir a condenação da concessionária recorrente a este título – inclusive levando-se em consideração a quantidade de ações em trâmite em que se pleiteiam danos morais supostamente oriundos do mesmo evento climático que assolou a região – significaria inviabilizar as atividades da própria prestadora de serviço público, o que, implicaria, consequentemente, no aumento dos custos de energia elétrica aos consumidores da região”.
[29] “Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.
[30] Ibidem.
[31] No julgamento do REsp 1.631.131/MG, a Terceira Turma do STJ, reverteu decisão do TJMG que havia reconhecido a ocorrência de dano moral por atraso de mais de 2 anos na entrega de imóvel. Em seu voto, a relatora consignou: “Assim, pode-se dizer que, para os recorridos, a recorrente atrasou na entrega da unidade imobiliária por período aproximado de 2 anos e 10 meses. Contudo, em razão de não ter sido invocado nenhum fato extraordinário que tenha ofendido o âmago da personalidade dos recorridos, não há falar em abalo moral indenizável”.
[32] COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.3.
[33] “Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.
[34] Confira-se a título meramente ilustrativo: STJ – AREsp 1.168.315/PI; TJRJ – APL 00023205020178190025 e TJDF – APL 00023205020178190025.
[35] Como o Direito do Consumidor contribui para o aperfeiçoamento do mercado. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-fev-28/garantias-consumo-direito-consumidor-ajudou-aperfeicoar-mercad…. Acesso em 23/08/2018.
[36] PASQUALOTTO, Adalberto. Dignidade do consumidor e dano moral. Revista de Direito do Consumidor. Vol. 110. ano 26. São Paulo: RT, mar.-abr. 2017, p. 86.
[37] Ibidem, p. 95.
[38] Embora Dessaune defenda a autonomia do dano pela perda do tempo, inclusive de caráter existencial, entendemos que o dano temporal caracteriza, afinal, dano moral, muito embora admitamos a autonomia dessa espécie de prejuízo para fins de fixação do respectivo quantum compensatório (GUGLINSKI, Vitor Vilela. O dano temporal e sua reparabilidade: aspectos doutrinários e visão dos tribunais. Revista de Direito do Consumidor. vol. 99. ano 24. p. 148-151. São Paulo: RT, maio-jun 2015). Entretanto, parcela da doutrina que se dedica ao estudo do dano pela perda do tempo o compreende como lesão autônoma, merecedora de reparação apartada. A esse respeito, confira-se: BORGES, Gustavo. O Paciente, a sua percepção do tempo e o dano temporal. Revista de Direito do Consumidor, v. 110, p. 187-209, mar/abr. 2017; MAIA, Maurilio Casas. O Dano Temporal Indenizável e o Mero Dissabor Cronológico no Mercado de Consumo. Revista de Direito do Consumidor, v. 92, p. 161-176, mar/abr. 2014; BASTOS, Maria Aparecida Dutra. A responsabilidade civil decorrente da perda tempo no contexto dos chamados “novos danos” e a necessidade de categorização do dano temporal. In: BORGES, Gustavo; MAIA, Maurílio Casas (org.). Dano temporal: o tempo como valor jurídico. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. p. 208-213. TARTUCE, Fernanda; COELHO, Caio Sasaki Godeguez. Reflexões sobre a autonomia do dano temporal e a sua relação com a vulnerabilidade da vítima. In: BORGES, Gustavo; MAIA, Maurílio Casas (org.). Dano temporal: o tempo como valor jurídico. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. p. 125-126. LIMA, Fernando Antônio de. Trabalho forense: sentença. In: BORGES, Gustavo; MAIA, Maurílio Casas (org.). Dano temporal: o tempo como valor jurídico. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. p. 291-298.
[39] DESSAUNE, Marcos. Teoria profundada do desvio produtivo do consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado e da vida alterada. 2ª ed. Vitória: Edição especial do autor, 2017, p. 135-136.
[40] GUGLINSKI, Vitor Vilela. O dano temporal e sua reparabilidade: aspectos doutrinários e visão dos tribunais. Revista de Direito do Consumidor. vol. 99. ano 24. São Paulo: RT, maio-jun. 2015, p. 127.
[41] “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO. FALHA NOS DEVERES DE INFORMAÇÃO E TRANSPARÊNCIA. FALTA DE BOA-FÉ CONTRATUAL. INDUZIMENTO DO CONSUMIDOR EM ERRO. DANO MORAL PLENAMENTE CONFIGURADO. AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DA SÚMULA 75 DO TJ/RJ. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER E IMPROCEDENTE O PEDIDO DE DANOS MORAIS. O OBJETO DA LIDE ERA A CONCESSÃO DE CRÉDITO ATRAVÉS DA MODALIDADE CARTÃO, BEM COMO O RECONHECIMENTO DE DANOS MORAIS. O BANCO DO BRASIL, ENTRETANTO, SUSTENTOU QUE A APELANTE CONTRATOU UM PRODUTO PARA O QUAL NÃO ERA DISPONIBILIZADO QUALQUER MODALIDADE DE CRÉDITO. TODAVIA, FINDOU COMPROVADO QUE O ALUDIDO CARTÃO ENVIADO À APELANTE FOI ACOMPANHADO DE CORRESPONDÊNCIA QUE INFORMAVA DE MODO INEQUÍVOCO QUE ELE PODERIA SER UTILIZADO TANTO PARA FUNÇÃO DÉBITO QUANTO PARA A FUNÇÃO CRÉDITO. FRISE-SE, TAMBÉM, QUE A CONDUTA DO APELADO FERIU O PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO À OFERTA E CONFIGUROU-SE COMO PUBLICIDADE ENGANOSA, NA FORMA DOS ARTIGOS 30 E 37, §1º, AMBOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DESTE MODO, FINDOU EVIDENCIADO QUE AS RECUSAS DE PAGAMENTO, COM A FUNÇÃO CRÉDITO, SOFRIDAS PELA APELANTE, FORAM HÁBEIS A CARACTERIZAR DANOS MORAIS A ELA, ANTE A VIOLAÇÃO CLÁSSICA DE SEUS DIREITOS DA PERSONALIDADE, RELATIVOS À SUA HONRA E À SUA IMAGEM. ASSIM, TORNA-SE DE FUNDAMENTAL IMPORTÂNCIA AFASTAR QUALQUER ALEGAÇÃO QUE RELACIONE ESTE CASO COM A DISCUTÍVEL DOUTRINA DO MERO ABORRECIMENTO. COM EFEITO, CABE AO JULGADOR, PARA RECONHECER OU NÃO O DANO EXTRAPATRIMONIAL, VERIFICAR A OCORRÊNCIA DE UMA LESÃO A UM DIREITO DA PERSONALIDADE, DE ACORDO COM O QUE É FEITO EM TODOS OS PAÍSES CIVILIZADOS DO MUNDO. ASSIM SENDO, O DIREITO DAS OBRIGAÇÕES, O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, O CÓDIGO CIVIL E, PRINCIPALMENTE, A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, NÃO PODEM DEIXAR DE TER VIGÊNCIA EM RAZÃO DE UMA SÚMULA ESTADUAL, QUE TRATA DE UM ASSUNTO QUE NÃO É DE SUA COMPETÊNCIA E QUE É UTILIZADA PARA NEGAR – COMO SE PRETENDIA NEGAR NESTE CASO – UM DIREITO QUE VEM PREVISTO EM LEI. RESUMINDO: A SÚMULA 75 DO TJ/RJ NÃO PODE SUPRIMIR UM DIREITO QUE FOI CRIADO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, QUAL SEJA, O DANO MORAL. QUANTUM REPARATÓRIO. UTILIZAÇÃO DO MÉTODO BIFÁSICO PARA ARBITRAMENTO DO DANO. VALORIZAÇÃO DO INTERESSE JURÍDICO LESADO E DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO EM R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS). PRECEDENTES. ASTREINTES. É NECESSÁRIO GIZAR A FUNÇÃO PRECÍPUA DA MULTA COMINATÓRIA QUE É A DE COMPELIR A PARTE A CUMPRIR A DECISÃO JUDICIAL, DE MODO QUE DEVE SER FIXADA EM VALOR QUE REALMENTE TENHA EFETIVIDADE. A REDUÇÃO DO VALOR DAS ASTREINTES APENAS TEM O CONDÃO DE MINIMIZAR A COERÇÃO SOBRE AQUELE QUE DEVA CUMPRIR DETERMINAÇÃO JUDICIAL. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO APELADO E PROVIMENTO DO RECURSO DA APELANTE”. (TJRJ, Apelação Cível , Vigésima Câmara Cível, Rel. Des. Alcides da Fonseca Neto, DJe 03/08/2018)
[42] Súmula 75 “O simples descumprimento de dever legal ou contratual, por caracterizar mero aborrecimento, em princípio, não configura dano moral, salvo se da infração advém circunstância que atenta contra a dignidade da parte”.
[43] Op. Cit.
[44] “A certeza de um castigo, mesmo moderado, sempre causará mais intensa impressão do que o temor de outro mais severo, unido à esperança da impunidade, pois, os males, mesmo os menores, quando certos, sempre surpreendem os espíritos humanos, enquanto a esperança, dom celestial que freqüentemente tudo supre em nós, afasta a idéia de males piores, principalmente quando a impunidade, outorgada muitas vezes pela avareza e pela fraqueza, fortalece-lhe a força”. (BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. 2ª ed. revista. São Paulo: RT, 1999, p. 87)
[45] No que interessa às relações de consumo, o autor propõe nos itens 11 e 12 de seu artigo o seguinte: “11 – que a empresa respeite os direitos do consumidor, que esteja sempre pronta para atender reclamações decorrentes de mau serviço ou defeitos em mercadorias e que as falhas encontradas sejam prontamente reconhecidas e corrigidas; 12 – que a empresa, como um todo, englobando empresários, dirigentes, trabalhadores, sinta-se parte de alguma coisa que é superior à empresa: a Pátria, a comunhão nacional, o sentimento de que todos fazemos parte de uma sinfonia universal, de uma caminhada da Civilização e da Cultura, na construção de um mundo melhor”. (HERKENHOFF, João Baptista. Ética nas empresas. Disponível em: http://conteudojuridico.com.br/index.php?artigos&ver=2.25340. Acesso em 05/09/2018)
[46] Ibidem, p. 112.
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