ECONOMIA DO CUIDADO E DIREITO DE FAMÍLIA: alimentos, guarda, regime de bens, curatela e cuidados voluntários

ECONOMIA DO CUIDADO E DIREITO DE FAMÍLIA: alimentos, guarda, regime de bens, curatela e cuidados voluntários

Carlos E. Elias de Oliveira

Consultor Legislativo do Senado Federal. Professor de Direito Civil, Notarial e de Registros Públicos. Pós-Doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Doutor, mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Consultor Legislativo do Senado Federal em Direito Civil, Advogado, ex-Advogado da União e ex-assessor de ministro STJ. Instagram: @profcarloselias e @direitoprivadoestrangeiro. E-mail: carloseliasdeoliveira@yahoo.com.br

Resumo

Este artigo trata da importância de promover alguns ajustes em institutos de Direito de Família em atenção aos debates que ocorrem no âmbito da Economia de Cuidado e à necessidade de eliminar premissas ainda baseadas em perspectivas de gênero. Levantam-se sugestões para o legislador e a jurisprudência nesse sentido. Discutem-se: (1) soluções de maior igualdade na definição das regras de guarda de filho menor de idade; (2) o pagamento de pensão compensatória em prol de quem assume os trabalhos de cuidado devidos ao outro genitor; (3) o maior rigor no cumprimento dos deveres parentais no regime de guarda; (4) a reformulação da ideia de alimentos transitórios ao ex-consorte; (5) o emprego da figura dos alimentos compensatórios em atenção aos trabalhos de cuidado desempenhados no curso do casamento às custas de um apagão profissional, independentemente de o ex-cônjuge ter ficado com patrimônio suficiente em razão da partilha; e (6) a maior razoabilidade no arbitramento do pro labore ao curador e a fixação de prestação compensatória a quem prestou trabalhos de cuidado a pessoa vulnerável antes do falecimento desta. Aproveita-se para apontar algumas regras positivas previstas no Anteprojeto de Reforma do Código Civil, elaborado pela Comissão de Juristas designada pelo Presidente do Senado Federal por meio do ATS nº 11/2023.

Palavras-Chave: Economia de Cuidado. Gênero. Direito de Família.

Introdução

Este artigo levanta reflexões práticas para combater um grave problema observado na prática forense do Direito de Família brasileiro: a desvalorização dos trabalhos de cuidado (costumeiramente referenciado na mídia como um tipo de trabalho invisível[1] pelo pouco reconhecimento do Direito) dentro das relações familiares[2]. Na conclusão, resumiremos, em tópicos, as ideias desenvolvidas neste artigo. O leitor que tenha mais urgência pode ir diretamente à conclusão para extrair, em tópicos, o que defendemos.

Trata-se de um tema que precisa ser levado em conta pelos profissionais do Direito (juízes, promotores, advogados) e também pelo próprio legislador, a fim de aprimorar as leis e a jurisprudência.

De fato, a prática forense do Direito de Família nem sempre dá o devido valor ao que se conhece como Economia do Cuidado ou, nos textos ingleses, como care economy ou care work.

Trata-se de um problema que agrava a posição ainda vulnerável da mulher, que, dentro da estrutura sociológica brasileira, ainda é principal incumbida em exercer atividades de cuidado.

Sob essa ótica, grande parte das mulheres brasileiras está sujeita a uma situação de invisibilidade na prática do Direito de Família.

Economia do Cuidado é objeto de estudo de diversas áreas do conhecimento, especialmente da Economia e da Sociologia. Há diversos estudos e pesquisas refletindo sobre o assunto com diversas propostas de corrigir a invisibilidade dos trabalhos de cuidado[3]. O assunto merece atenção também no Direito de Família, o que é o foco do presente artigo.

Por Economia do Cuidado, entendem-se os serviços prestados em favor de uma pessoa para seu cuidado pessoal. Abrangem trabalhos domésticos (ex.: cozinhar, limpar casa etc.) e operacionais (ex.: transporte de filhos para escola, gerenciamento do patrimônio de terceiros, etc.).

Vários trabalhos de cuidado são remunerados, como os de empregados domésticos, os de casa de repouso, os de assistência médica etc.

Outros são exercidos sem remuneração alguma, como os desempenhados no âmbito familiar. Sobre o assunto, trazemos a lume este excerto de estudo sobre o tema[4]:

Existe uma crescente consciência em nível internacional com relação ao papel da chamada economia de cuidado e seu continuado crescimento nas próximas décadas. Conforme a definição da OIT, o trabalho de cuidado – remunerado e não remunerado – envolve atividades diretas, como alimentar um bebê ou cuidar de um idoso, e atividades indiretas, como limpar ou cozinhar (OIT, 2018a). Estima-se que 2,1 bilhões de pessoas (1,9 bilhão de crianças com menos de 15 anos de idade e 0,2 bilhão de idosos) precisavam de cuidado em 2015. E a previsão é de que este número aumente para 2,3 bilhões de pessoas até 2030, devido ao número crescente de crianças, idosos e pessoas com deficiência (op. cit.).

O papel de cuidado – remunerado e não renumerado – acaba sendo assumido principalmente pelas mulheres, como uma caraterística comum internacionalmente. Um relatório global da OIT confirmou que em nenhum país os homens e as mulheres contribuem com esforços iguais de cuidado não remunerado. Estima-se que, na média, as mulheres forneçam 76,2% do total de trabalho de cuidado não remunerado (OIT, 2018a).

Algumas tendências – por exemplo, a diminuição no número de pessoas disponíveis para cuidar, bem como as mudanças na estrutura dos domicílios – estão reduzindo o papel do modelo tradicional de família estendida e transicionando a uma proporção maior de famílias nucleais, as quais compõem 43,5% da população em idade ativa (PIA) global, somadas a um crescente número de diferentes configurações de domicílios (Guerra, 2017).

No Direito de Família, o nosso foco está na invisibilidade total ou parcial dos trabalhos de cuidado não remunerados, prestados por familiares por razões de afeto e de organização familiar. É sobre esse aspecto que nos debruçaremos.

1     Alimentos e guarda de filho menor de idade

1.1.     O regime legal da guarda e dos alimentos

Já tivemos a oportunidade de, com suporte em estudos de psicólogos sociais, denunciar os problemas práticos de boicote hermenêutico[5] perpetrado pela prática judicial ao regime legal da guarda compartilhada[6].

De fato, apesar da clareza do texto legal, a prática forense – com algumas exceções – demonstra que, se não há acordo entre os genitores, geralmente a mãe assume a maior parte do tempo de convivência com o filho e o papel de gestão financeira das despesas do filho. O pai limita-se a ter períodos curtos de convivência (como se fosse um visitante forasteiro) e a pagar um valor pecuniário a título de pensão alimentícia (como se fosse um mero banco).

Já defendemos que essa linha adotada em diversas sentenças está absolutamente descolada do regime legal da guarda compartilhada.

O correto seria que, salvo exceções justificadas pelas particularidades do caso concreto, o tempo de convivência fosse repartido igualmente na semana entre ambos os genitores. Além disso, o adequado seria que cada genitor custeasse, in natura, as despesas intramuros do filho durante os respectivos períodos de convivência e distribuíssem, entre si, o dever de custeio in natura das despesas extramuros.

É evidente que, se um dos genitores não dispuser de capacidade financeira adequada, será cabível a fixação de alimentos pecuniários para custeio das despesas intramuros durante o período de convivência com esse genitor mais modesto financeiramente.

O fato é que, como reflexo da estrutura sociológica brasileira – ainda presa a um predomínio de cultura que atribui deveres por questões de gênero –, o que se vê é que as mulheres acabam assumindo quase que a integralidade dos trabalhos de cuidado em relação ao filho menor de idade. Os pais, por outro lado, ficam liberados desses trabalhos, de modo a ter tempo livre para investir em seu crescimento profissional, em novas relações e no que quiser.

Entendemos que, já com respaldo na legislação atual – edificada na igualdade de deveres de ambos os genitores –, algumas correções de rumo precisam ser feitas em prestígio à Economia de Cuidado.

Uma delas é a importância de se implementar, na prática forense, efetivamente as regras desenhadas pelo legislador para a guarda compartilhada, sem concentrar indevidamente os papéis de trabalhos de cuidado na mãe.

Isso vale até mesmo para crianças de tenra idade, desde que já não estejam mais sujeitas a aleitamento materno. Já havíamos defendido essa tese em artigo anterior[7]. Pouco tempo depois, houve a aprovação do Enunciado nº 671 das Jornadas de Direito Civil, na IX Jornada de Direito Civil, ocorrida no ano 2022 com este comando: “A tenra idade da criança não impede a fixação de convivência equilibrada entre ambos os pais”.

Por fim, é crucial recordar que eventual culpa pelo fim do casamento ou da união estável é irrelevante para a definição do regime de guarda. Além disso, é totalmente ultrapassado pensar que a mãe – por ser mulher – seria biologicamente a vocacionada a ter a preferência na guarda do filho. Com autoridade e didatismo peculiares, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho ilustram isso:[8]

Já cuidamos de mencionar que, para efeito da fixação da guarda de filhos, há de se levar em conta o interesse existencial da prole, e não a suposta responsabilidade daquele que teria dado causa ao fim do casamento.

Assim, imagine-se que o sujeito não haja sido um bom marido.

Enamorou-se de outra no curso do matrimônio.

Mas sempre se comportou como um pai exemplar, não permitindo que os seus filhos experimentassem influência perniciosa.

Ora, se, no curso do processo judicial em que se discute a guarda dos filhos – e isso, claro, pode ser analisado, sim, em procedimento de divórcio, desde que haja sido cumulado pedido nesse sentido –, ficar demonstrado que o genitor tem melhores condições para o exercício da guarda, poderá obter o deferimento desta.

1.2.     Pensão compensatória: uma compensação pecuniária aos trabalhos de cuidado da mãe

Imaginemos a hipótese em que, em razão das regras de guarda de filhos de pais que não coabitam, a mãe fique com o maior tempo do período de convivência com o filho menor de idade.

Suponha, ainda, que, em favor do filho, a mãe administra a pensão alimentícia pecuniária paga pelo pai. Essa hipótese (de pensão alimentícia pecuniária a ser paga pelo pai ao filho menor de idade) também tem de ser deveria ser excepcional, pois a regra é que os alimentos dos filhos menores de idade sejam in natura mesmo quando os pais não coabitam[9].

Nesse caso que deveria ser excepcional (de a mãe concentrar os trabalhos de cuidado do filho), entendemos que a mãe também tem direito a uma compensação pecuniária pelos trabalhos de cuidado que exerce. Essa compensação deverá ser proporcional à sua dedicação por esses trabalhos de cuidado. Trata-se do que chamamos de pensão compensatória.

Em outras palavras, o pai terá de arcar com a pensão alimentícia devida ao filho e, paralelamente, terá de pagar uma pensão compensatória para a mãe.

Na situação, por exemplo, de uma mãe que deixa sua carreira profissional para cuidar do filho (que pode ter necessidade de cuidados especiais por alguma restrição de saúde), a pensão compensatória deve ser maior. Afinal de contas, os trabalhos de cuidado da mãe acabam dispensando a contratação de profissionais de cuidado.

Já na hipótese de uma mãe que consegue contratar profissionais do lar para exercer trabalhos de cuidado (como as famosas babás), o valor da pensão compensatória tem de ser menor.

Em relação a essa pensão compensatória devida ao genitor que concentrou os trabalhos de cuidado com o filho, indaga-se: como essa compensação financeira deve ser paga?

Entendemos que esse valor deveria ser pago em uma parcela autônoma, a ser fixada pelo juiz para pagamento mensal, enquanto os trabalhos de cuidado forem desempenhados.

A ideia é que esse valor seja uma compensação pecuniária pelo trabalho que o outro genitor tinha o dever de realizar, mas que, por conta do regime de guarda, não o desempenha.

 Lembramos que só se deve falar na pensão compensatória naquela situação excepcional de definição das regras de guarda em que um dos genitores (geralmente, a mulher, na estrutura social brasileira) fica com uma concentração maior dos trabalhos de cuidado do filho.

Se ambos os genitores, porém, compartilham efetivamente os trabalhos de cuidado, não há motivos para o pagamento da pensão compensatória.

Apesar disso, desconhecemos julgados que, por enquanto, fixem a pensão compensatória de forma autônoma.

Na prática, essa pensão compensatória é admitida implicitamente pela jurisprudência dentro do valor da pensão alimentícia paga ao filho menor de idade. Os juízes costumam fixar um percentual do salário do genitor para a definição dessa pensão devida ao filho e não se mostram muito hospitaleiros a pretensões do alimentante em exigir que o outro genitor comprove, matematicamente, o direcionamento exclusivo da verba em favor de despesas do próprio filho.

O STJ, por exemplo, só admite a ação de exigir contas em situações bem excepcionais, em que há pensões alimentícias de valores elevados sem que se identifique efetivo benefício do filho.[10]

Sabe-se que, em muitos casos – notadamente de pensões mais elevadas –, o genitor incumbido da gestão financeira do filho acaba utilizando da verba para si mesmo. No fundo, o que a jurisprudência implicitamente está a reconhecer que esse genitor merece ser compensado economicamente pelo trabalho de cuidado (work care) desempenhado em favor do filho menor de idade. Enfim, o que chamamos de pensão compensatória vai embutido de modo implícito na pensão alimentícia paga ao filho menor de idade.

Apesar de não nos parecer adequada essa solução jurisprudencial implícita, não se trata de uma teratologia. Isso, porque o beneficiário dos trabalhos de cuidado (work care) é o próprio filho menor de idade, de modo que é razoável que o valor financeiro por ele recebido seja empregado para compensar economicamente os prestadores desses serviços. Seja como for, entendemos que a prática jurisprudencial deveria mudar, alinhando-se ao caminho mais técnico do ponto de vista legal, destacando dos alimentos pecuniários do filho a pensão compensatória devida ao genitor que hegemoniza os trabalhos de cuidado do filho.

Entendemos ser preferível que a pensão compensatória seja fixada de modo autônomo, a fim de realçar a sua finalidade de reconhecer a importância da Economia do Cuidado no Direito de Família.

Cabem quatro alertas.

De um lado, a compensação financeira supracitada não é uma remuneração, porque a dedicação da mãe não é movida por uma relação contratual, e sim por um vínculo de afeto familiar de Direito de Família. Trata-se apenas de uma compensação financeira pelo reconhecimento do valor econômico do trabalho de cuidado. Uma decorrência prática dessa natureza jurídica compensatória é que a prestação compensatória não poderia ser considerada fato gerador de imposto de renda.

De outro lado, soa contraditório e até certo ponto hipócrita e pueril fechar os olhos ao sacrifício patrimonial e profissional que a mãe faz para investir sua atenção e sua vida para prestar trabalhos de cuidado ao filho. Argumentar que ela não teria direito a qualquer tipo de compensação pecuniária pelo fato de esse cuidado decorrer de afeto ou de dever jurídico é corroborar a estrutura de desigualdade de gênero tão combatida na sociedade atual.

É esquecer que, enquanto a mãe está em uma situação de apagão profissional para investir sua vida nos trabalhos de cuidado ao filho menor de idade, o pai está com tempo liberado para aumentar o patrimônio mediante investimentos profissionais.

Citamos exemplos aqui da mãe pelo fato de a realidade sociológica brasileira ainda concentrar sobre os ombros da mulher os papéis de cuidado dos filhos menores. Todavia, tudo o que nós expusemos acima seria aplicado plenamente ao pai, se estivéssemos diante de um quadro pouco comum no Brasil: a de a mãe limitar-se a pagar pensão alimentícia, e o pai assumir os papéis de cuidados diretos do filho menor de idade com o maior tempo de convivência.

Por fim, merece elogio o Código Civil argentino por fazer menção à Economia de Cuidado ao determinar que, no arbitramento dos alimentos a serem pagos ao ex-cônjuge, devem-se levar em conta os trabalhos de cuidado feitos em favor do filho menor de idade. É o que estabelece o art. 433, “a”, do Código Civil argentino[11]. Semelhantemente, mesmo no caso de fixação de alimentos em favor do filho, o art. 660 do Código Civil argentino[12] reconhece que o trabalho de cuidado de um dos genitores também tem expressão econômica. Em conversa pessoal com a jurista argentina Ainda Kemelmajer, que foi membro da Corte Suprema Corte de Justiça de Mendonza, a prática jurisprudencial argentina é similar à brasileira. Ou seja, nas hipóteses em que a mãe assume os trabalhos de cuidado do filho menor de idade, a pensão alimentícia costuma ser fixada em pecúnia com base em um percentual do salário do pai, de modo a custear integralmente as despesas do filho. A mãe, por outro lado, colabora com o cuidado do filho mediante o trabalho in natura de cuidado. Desse modo, o trabalho de cuidado da mãe acaba sendo estimado economicamente.

1.3.     Maior rigor diante de descumprimento dos deveres parentais relativos ao período de convivência

É certo que, se um genitor não quer manter convivência com o filho menor de idade, não é razoável obrigá-lo a tanto. Isso, porque estaríamos a submeter uma criança ou um adolescente a uma convivência hostil e potencialmente violenta: o Direito não desfruta de onipotência e, por isso, não pode obrigar um pai a amar. Em casos lamentáveis como esse, o Direito deve buscar alternativas viáveis que prestigiem o melhor interesse da criança e do adolescente, como calibrar com mais intensidade o valor da pensão alimentícia, a fim de viabilizar o custeio de profissionais de cuidado e, até mesmo, profissionais da saúde para acompanhar o bem-estar psicológico desse filho menor de idade.

Nos casos, porém, em que o pai ou a mãe querem manter convivência com o filho e inexista qualquer circunstância impeditiva disso, o juiz deve prestigiar uma divisão – ao máximo – igualitária do tempo de convivência e dos papéis de cuidado.

Ambos os genitores devem velar pelo cumprimento de seus deveres parentais relativos ao período de convivência, como o de buscar ser pontual nos deveres de buscar ou de devolver o filho menor de idade.

Eventuais falhas devem ser toleradas por ambos os genitores, pois imprevistos são algo da vida. Também pequenos atrasos devem ser relevados em nome das regras de boa convivência.

Quando, porém, um genitor sistematicamente descumpre seus deveres relativos ao período de convivência, é necessário maior rigor na repreensão dessas irregularidades. Isso porque tais descumprimentos acabam por sobrecarregar o outro com trabalhos de cuidado e, em consequência, terminam por prejudicar projetos profissionais ou pessoais do outro.

Na prática familiarista brasileira, o mais comum é que a mãe seja a sobrecarregada com descumprimentos sistemáticos de pais negligentes, que não buscam os filhos nos dias, nem nos horários devidos ou que atrasam significativamente. Fechar os olhos para isso e passar o “pano quente” seria desprezar a expressão econômica dos trabalhos de cuidado, corroborando, mais uma vez, uma cultura de desdém baseada em predeterminismos de gênero.

Daí se indaga: qual seria a repreensão mais adequada?

Rejeitamos medidas de redução do período de convivência, pois isso seria punir a criança ou o adolescente com o distanciamento afetivo em relação ao genitor negligente.

Preferimos o emprego de punições financeiras, como “multas” fixadas pelo juiz contra o genitor relapso, a serem revertidas em favor do outro genitor.

Consideramos que o ordenamento jurídico atual respalda essas “multas” de modo indireto, pois elas, na verdade, representam espécies de indenização por danos causados ao outro genitor (art. 927, CC) e decorrem do dever de cuidado dos filhos (art. 1.566, IV, CC). Esses danos consistem na desmobilização feita por esse outro genitor para prestar os trabalhos de cuidado no lugar do genitor moroso. Consideramos esse dano como moral e, por isso, seu arbitramento deverá ser feito de modo mais ou menos aleatório pelo juiz, com vistas às particularidades do caso concreto.

Outra sanção cabível seriam meios coercitivos indiretos, como as astreintes. Estas são instrumentos processuais destinados a coagir o devedor a cumprir uma obrigação de fazer, o que abrange a situação do dever parental relativo ao período de convivência.

É evidente que o juiz não pode banalizar esses tipos de repreensões. Atrasos ou falhas pontuais precisam ser toleradas. As reprimendas acima só são devidas em casos de insistente recalcitrância do genitor em cumprir seus deveres parentais.

1.4.     Divisão, ao máximo, igualitária do tempo de convivência

A regra geral na guarda compartilhada é a de que ambos os genitores devem, ao máximo, ter o mesmo tempo de convivência com o filho menor de idade. Particularidades do caso concreto podem afastar a regra geral. Já tratamos disso em outro artigo[13].

Essa divisão – ao máximo – igualitária guarda plena aderência ao ambiente atual de igualdade de gêneros, por abandonar a ultrapassada concepção de que mulheres seriam biologicamente as únicas a serem obrigados a exercer papéis de cuidado da criança ou do adolescente.

Nesse sentido, mesmo no caso de crianças de tenra idade – quando se se tiver completado o seu desmame –, a divisão do período de tempo de convivência tem de ser – ao máximo – igualitária. Nesse sentido, o enunciado nº 671 das Jornadas de Direito Civil dispõe: “a tenra idade da criança não impede a fixação de convivência equilibrada com ambos os pais”.

De um lado, essa divisão – ao máximo – igualitária colabora para que a criança, desde seus primeiros raios de vida, acostume-se afetivamente com ambos os genitores. E a verdade é que ambos os genitores são igualmente importantes para o filho. Sem uma divisão ao máximo igualitária do tempo de convivência, a tendência é a fabricação de uma espécie de semi-orfandade. Se os genitores não coabitam, o filho que tem dois genitores também tem dois lares. Maria Berenice Dias, com razão, rechaça a tese abstrata e indevida de que esse quadro seria prejudicial, averbando:[14]

Costuma-se repetir, sem qualquer embasamento empírico, que esse regime [o de divisão ao máximo igualitária de tempo de convivência do filho com os genitores] é prejudicial ao desenvolvimento da criança. Trata-se de estereótipo bastante sedimentado e que faz com que pouquíssimas residências simultâneas sejam fixadas pelo Judiciário brasileiro. E pior do que isso, o que assume exponencial gravidade, é a existência de decisões judiciais que se negam a homologar acordos consensuais em que os pais acordaram a divisão de residências. Outrossim, são poucos os representantes do Ministério Público que interferem de forma contrária à homologação desses acordos, com base em um clichê, repito, jamais comprovado.

Aliás, conforme já expusemos em outro artigo, psicólogos sociais demonstram, com base em estudos empíricos, que a tradicional e equivocada concentração do período de convivência em apenas um genitor – transformando o outro em um mero “visitante forasteiro” – acaba sendo uma fábrica judicial de semi-orfandades.[15]

O regime acima nada tem a ver com a guarda alternada, a qual deve ser entendida como uma sucessiva e contínua mudança de guarda unilateral entre os genitores em períodos de tempo, como se o “bastão da responsabilidade parental” pulasse das mãos de um genitor para o outro periodicamente (semanalmente, por exemplo). Nas palavras de Conrado Paulino da Rosa, a guarda alternada indicada uma “alternância do poder de decisão”, o que implica “uma sucessão de guardas unilaterais”.[16]

Na guarda compartilhada, o “bastão da responsabilidade parental” segue nas mãos de ambos os genitores. Todavia, o filho conviverá com ambos, em divisão de tempo ao máximo igualitário, de modo a desenvolver-se afetiva e pessoalmente com participação igualitária da cultura, do afeto e da personalidade de ambos os genitores. Divisão ao máximo igualitária do tempo de convivência não é sinônimo de guarda alternada, porque ela também é uma característica da guarda compartilhada.

É indevido negar esse direito da criança e estimular a semi-orfandade, com uma acusação inadequada de que a convivência igualitária com ambos os pais seria necessariamente uma guarda alternada.

O mero fato de os pais não coabitarem já imporá desafios para o filho menor de idade. A questão é: definir que solução trará menos prejuízos ao filho. Entendemos que o legislador bateu o martelo, escolhendo a solução da divisão ao máximo igualitário do tempo de convivência. Eventual prejuízo que o filho possa ter com o trânsito de uma casa para a outra foi considerado inferior ao prejuízo da semi-orfandade causada com o distanciamento afetivo do filho, pelo legislador com base em visões contemporâneas da Psicologia Social.

Em palavras mais populares, é melhor o Direito chancelar uma criança mochileira (expressão que alguns juristas se referem às crianças que transitam entre as casas dos pais divorciados) do que fabricar uma criança semi-órfã.

De outro lado, a divisão ao máximo igualitário do período de convivência distribui, com paridade, os papéis de cuidado do filho, de modo a não sobrecarregar a mãe com um dever que, por lei, é de ambos os genitores.

Tudo isso coaduna com a necessária observância da Economia do Cuidado no âmbito do Direito de Família, reconhecendo que o investimento de tempo no cuidado do filho também envolve um sacrifício profissional e pessoal, a ser realizado igualmente por ambos os genitores.

2    Divórcio ou extinção da união estável

2.1.     Alimentos familiares ao ex-cônjuge

A jurisprudência consolidou a regra de que, no caso de extinção da sociedade conjugal ou convivencial, o ex-cônjuge em situação de necessidade financeira só terá direito a alimentos transitórios, geralmente por dois anos, tendo em vista a necessidade de sua reinserção no mercado de trabalho. Há até precedentes jurisprudenciais que justificam esse entendimento afirmando que “casamento não é emprego e marido não é órgão previdenciário” (TJRS – 8a CC – Ap. Civ. 596068106, j. 29/08/1996 – Rel. Des. Eliseu Gomes Torres”).

A exceção dá-se para a hipótese de a reinserção no mercado de trabalho ser demasiadamente onerosa, como na hipótese de senilidade ou incapacidade laboral física do ex-cônjuge.

Entendemos que essa orientação jurisprudencial precisa ser vista com cautela.

Ela guarda aderência com os modelos de família mais modernos, em que ambos os cônjuges mantêm autonomia profissional ao longo do casamento ou da união estável. Nessas hipóteses, realmente os alimentos ao ex-consorte devem ser transitórios.

Não se deveria, porém, aplicar esse entendimento jurisprudencial para situações em que a ex-esposa ou a ex-companheira[17] abdicou de sua vida profissional por longo período de tempo para exercer trabalhos de cuidado em prol do seu ex-consorte ou dos filhos.

Seria de uma insensibilidade jurídica atroz negar a essa ex-consorte uma proteção patrimonial adequada, ainda mais quando se constatar que o seu ex-consorte prosperou economicamente ao longo do relacionamento aproveitando-se do conforto do lar.

Se a ex-consorte que se dedicou ao lar em detrimento da própria carreira profissional vier a ficar em situação de vulnerabilidade patrimonial com a partilha de bens decorrentes do fim do casamento ou da união estável, é fundamental que ela seja beneficiada por uma pensão alimentícia mais duradora e razoável.

Em casos em que fique demonstrado que o ex-consorte cresceu financeiramente desfrutando de tempo livre propiciado pelo sacrifício pessoal de sua ex-esposa ou ex-companheira, é de se colocar na mesa até mesmo eventual fixação vitalícia de pensão alimentícia.

Pense, por exemplo, em um casal em que a mulher abra mão da vida profissional para cuidar do lar e de quatro filhos. Suponha que o marido era inexpressivo economicamente ao tempo do início do casamento, mas, aproveitando-se do harmônico background familiar, conseguiu passar em um concurso para ganhar o teto do funcionalismo público. Imagine que o casamento chegue ao fim após 20 anos. Na partilha de bens, a ex-esposa recebe um patrimônio inexpressivo e insuficiente para lhe arrimar uma vida de padrão social próximo da que desfrutava.

Em um caso como esse, consideramos que a pensão alimentícia a ser fixada a ex-esposa deveria ser vitalícia, sob pena de desprezar os trabalhos de cuidado que ela realizou ao longo do casamento e de prestigiar ímpetos vampíricos de quem suga as forças de outrem para crescer profissionalmente. No exemplo, o emprego público conquistado pelo ex-marido deve-se substancialmente aos trabalhos de cuidado desempenhados pela ex-esposa.

Eventualmente, os alimentos acima poderiam ser substituídos por alimentos compensatórios, conforme exporemos mais abaixo. O importante é não desprezar a expressão econômica e a relevância dos trabalhos de cuidado exercidos – geralmente – pela mulher.

Em prol do que defendemos, merece registro certeira crítica de Maria Berenice Dias contra a aplicação indiscriminada e aleatória da tese da transitoriedade dos alimentos, in verbis:[18]

No entanto, com o nome de alimentos transitórios, de modo absolutamente aleatório, passou a Justiça a impor termo final ao dever alimentar. (…)

(…) O próprio Cristiano Chaves alerta que o magistrado deve estar atento ao processo cultural, ao projeto de vida do casal e ao nível de dependência criado, voluntariamente ou não entre eles. Se, de um lado, observa-se um notável (e justo) avanço da liberdade comportamental feminina, ocupando diversas posições sociais, de outra banda, ainda se tem relacionamentos afetivos em que a insegurança e a vaidade masculina (que beiram a burrice emocional) terminam por subjugar a mulher nas situações mais cotidianas e banais.

Desgraçadamente, não desapareceu o ranço cultural, conservador e machista das estruturas familiares. E, durante o período da vida e comum – por opção ou imposição –, a mulher fica fora do mercado de trabalho. Afinal, é dela o encargo com a casa, o marido e a única responsável pelos filhos, doentes e idosos. Além disso, percebe menos de 30% do que o homem no desempenho da mesma atividade profissional.

Às claras que, sem qualificação, fora do mercado do trabalho há muito tempo, em um país em que o número de desempregados é assustador, não há como se presumir ingenuamente que a necessidade de prover a própria subsistência vai cessar à medida em que mulher for envelhecendo.

O fato é que essa perversa tendência se alastrou. (…)

É preciso separar o joio do trigo. Nem todos os relacionamentos atuais seguem o modelo desenhado pela modernidade, de autonomia profissional e financeira de cada consorte. Não podemos chancelar a insensibilidade e até mesmo o enriquecimento sem justa causa de um ex-cônjuge que, vampirescamente, suga décadas de trabalhos de cuidado do outro para construir uma posição profissional privilegiada e, depois, com o fim do relacionamento, limita-se a dar uma “esmola” por dois anos (tempo, costumeiramente, adotado pela jurisprudência para os alimentos transitórios). E tudo isso, sob a falsa e equivocada premissa de que esse seria o tempo necessário para a reinserção do mercado daquele ex-consorte (geralmente, a mulher) que sofreu um apagão profissional por décadas em favor da família e do crescimento profissional do outro ex-consorte.

2.2.    Alimentos compensatórios: necessidade de ir além das hipóteses de vulnerabilidade financeira do cônjuge

Há casos em que, com o divórcio ou a dissolução da união estável, um dos ex-consortes – geralmente, a mulher (na realidade sociológica brasileira) – fica em situação de vulnerabilidade financeira, ao passo que o outro sai em condição avantajada patrimonialmente.

Isso costuma acontecer quando o casal adotou o regime da separação convencional de bens ou quando, apesar da escolha de outro regime, não houve aquisição substancial de bens comuns.

Para hipóteses como essas, a jurisprudência e a doutrina vêm admitindo a fixação de uma prestação de natureza compensatória em favor do ex-cônjuge vulnerável.

Trata-se do que se conhece como alimentos compensatórios, em relação ao qual invocamos o talento didático de Flávio Tartuce, que lembra o protagonismo doutrinário do igualmente genial Rolf Madaleno no desenvolvimento do tema no Brasil, in verbis:[19]

Como primeiro instituto a ser abordado, vejamos a matéria relativa aos alimentos compensatórios, construção desenvolvida no Brasil por Rolf Madaleno, a partir de estudos do Direito Espanhol e Argentino. (…) Desse modo, (…) os citados alimentos visam a indenizar “por determinado tempo ou não, o desequilíbrio econômico causado pela repentina redução do padrão socioeconômico do cônjuge desprovido de bens e meação, sem pretender a igualdade econômica do casal que desfez sua relação, mas que procura reduzir os efeitos deletérios surgidos da súbita indigência social, causada pela ausência de recursos pessoais, quando todos os ingressos eram mantidos pelo parceiro, mas que deixaram de suportar a separação ou o divórcio” (MADALENO, Rolf. Curso…, 2008, p. 276).

A hipótese típica é de escolha pelas partes do regime de separação convencional de bens, em que não há a comunicação de qualquer bem. Finda a sociedade conjugal ou convivencial, é possível que um dos consortes pleiteie do outro uma verba extra, a título de alimentos compensatórios.

A ideia é que essa prestação seja suficiente para atenuar a redução abrupta do padrão de vida do ex-consorte mais vulnerável. O valor pode ser fixado em parcela única ou em parcelas periódicas, tudo a depender das particularidades patrimoniais do caso.

Se, por exemplo, o outro consorte ter ficado com um patrimônio ilíquido, mas ter um salário de alta envergadura, seria razoável que os alimentos compensatórios fossem estimados em um percentual do salário por um período de tempo considerável, apto a garantir uma maior emancipação financeira do ex-cônjuge.

Não se podem banalizar os alimentos compensatórios. Eles devem ser fixados apenas para relacionamentos mais duradouros (de cerca de 20 anos, por exemplo), em que fique evidenciado que o ex-consorte vulnerável se dedicou aos trabalhos de cuidado. Não há necessidade de provar que esse ex-cônjuge fazia trabalhos domésticos diretamente, porque há outros trabalhos de cuidado igualmente relevantes à família. Até mesmo respaldos emocionais são relevantes. Por isso, deve-se presumir que o ex-consorte vulnerável desempenhou os trabalhos de cuidado ao longo do relacionamento duradouro, em nome das máximas da experiência comum (art. 375, CPC).

Essa presunção, porém, pode ser afastada, mediante prova em contrário.

Pense, por exemplo, em um casal de dois empresários bem-sucedidos que sempre geriram as suas próprias finanças e em que nenhum deles efetivamente abriu mão de sua vida profissional para se dedicar aos trabalhos de cuidado em prol do outro ou dos filhos. Suponha-se que um deles venha à falência e, pouco tempo depois, o casamento acabe. Em um caso como esse, não é razoável a fixação de alimentos compensatórios. Isso, porque, nesse caso, o ex-consorte vulnerável chegou a uma situação de penúria única e exclusivamente por sua má sorte profissional, e não por nenhuma dedicação patrimonial à família.

Imagine, ainda, um casamento que tenha durado apenas 3 anos. Não é razoável pensar em alimentos compensatórios para relacionamentos-relâmpagos.

Enfim, os alimentos compensatórios são uma importante ferramenta para prestigiar a Economia do Cuidado no âmbito do Direito de Família.

Como já dito, a doutrina e a jurisprudência têm vinculado os alimentos compensatórios a hipóteses em que um dos ex-cônjuges ficou sem patrimônio adequado para evitar uma abrupta e brutal queda do padrão socioeconômico.

Entendemos, porém, que a hipótese de cabimento dos alimentos compensatórios tem de ir além, para também cobrir também casos em que o ex-cônjuge tenha sofrido um apagão profissional para se dedicar aos trabalhos de cuidado da família. E não importa se, ao final do casamento, esse ex-cônjuge ficou ou não com um patrimônio razoável. É que, se ele não tivesse sofrido esse apagão profissional, sua condição financeira provavelmente seria muito melhor, pois provavelmente teria alguma profissão da qual obteria um salário ou uma renda mais considerável.

Aliás, nesse sentido, o Anteprojeto de Reforma do Código Civil, elaborado por juristas nomeados pelo Presidente do Senado Federal por meio do ATS nº 11/2023[20], previu uma elogiosa regra nesse sentido, determinando que o juiz fixe uma compensação pecuniária pelos trabalhos de cuidado do ex-cônjuge. Essa regra ficou vinculada aos casos de regime da separação de bens, mas consideramos que seria muito razoável estendê-la a outros regimes de bens[21].

Seja como for, mesmo sem previsão legal expressa, consideramos que os alimentos compensatórios possuem respaldo no nosso ordenamento jurídico, especialmente com fundamento na dignidade da pessoa humana, na vedação ao enriquecimento sem causa e no princípio da igualdade de gêneros.

Com efeito, os alimentos compensatórios é um instrumento que se destina a compensar financeiramente aquele ex-consorte pelo longo tempo de abdicação pessoal em favor da família.

Maria Berenice Dias, com razão, associa os alimentos compensatórios a uma espécie de indenização pela perda da chance que o ex-consorte suportou ao ter-se dedicado para a família em vez de ter investido no próprio crescimento profissional. Veja suas palavras:[22]

Mesmo que o credor de alimentos compensatórios trabalhe e tenha renda própria, mas insuficiente para a mantença do seu padrão econômico conjugal, perdido em decorrência do divórcio, perdeu a chance de investir em seu próprio capital humano. Assim, os alimentos compensatórios cobrirão seus prejuízos com a periódica prestação pecuniária, como dívida moral que em nada aumentará sua riqueza econômica, mas tratará somente de substituir a perda sofrida.

Por isso, os alimentos compensatórios podem ser considerados como uma indenização pela perda da chance experimentado por um dos cônjuges durante a união. Como não dispõe de conteúdo alimentar, sua fixação não se submete às vicissitudes do trinômio proporcionalidade-possibilidade-necessidade. Dessa forma, mesmo que o beneficiário venha a obter meios de prover sua subsistência, tal não dispensa o devedor de continuar alcançando-lhe o valor estipulado. (…)

Por fim, é preciso conciliar a tese dos alimentos compensatórios, ora exposta, com eventual fixação de alimentos familiares fixados ao ex-cônjuge (que tratamos em subcapítulo anterior). O importante é assegurar que, após o fim do casamento, o ex-cônjuge seja devidamente confortado financeiramente nas hipóteses em pauta, seja a título de alimentos compensatórios, seja sob o rótulo de alimentos familiares.

3    Cuidados a pessoas vulneráveis: pro labore em curatelas e prestação compensatória em cuidados voluntários a familiar falecido

Outras aplicações práticas da Economia do Cuidado devem ser realizadas no âmbito do Direito de Família, como em hipóteses de dedicação no cuidado de um familiar que seja uma pessoa idosa ou uma pessoa sob curatela.

Nesses casos, é importante que os juristas se preocupem em reconhecer a expressão econômica dos trabalhos de cuidado exercidos pelo familiar generoso.

No caso de curatelas, por exemplo, os juízes deveriam ser menos incontinentes na fixação do pro labore (arts. 1.752 e 1.774, CC), especialmente quando inexistir qualquer Diretiva de Curatela sobre o tema[23].

É claro que se deve atentar para a capacidade financeira da pessoa sob curatela. Mas, em havendo capacidade financeira adequada, o valor do pro labore tem de ser adequado, tendo em vista, inclusive, a média dos preços cobrados por profissionais do cuidado.

Soa, por exemplo, absurdo a fixação de pro labore de um salário mínimo, quando o curatelado possui patrimônio considerável e quando se lembra que os estabelecimentos de repouso – para prestar serviço muito menos personalizado – costumam cobrar valores muitas vezes superior. Por exemplo, temos ciência de casas de repouso que cobram mensalidades de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para o acolhimento de pessoas idosas.

Fixar valores irrisórios de pro labore, em situações de alta capacidade econômica da curatela, seria chancelar um vampirismo afetivo indevido: a pessoa vulnerável (e, por reflexo, os seus futuros herdeiros) enriquece-se ao deixar de contratar profissionais para se servir – quase que gratuitamente – do trabalho pessoal do curador.

E é importante lembrar que o curador geralmente assume o munus por conta de sua proximidade afetiva com a pessoa vulnerável. Em grande parte dos casos, esse curador prestaria os trabalhos mesmo sem compensação financeira alguma, por conta do forte vínculo afetivo. Não podemos permitir a prática oportunista de explorar essa proximidade afetiva, impondo ao curador um sacrifício patrimonial que, na prática, se reverterá patrimonialmente em favor da pessoa vulnerável (e, por tabela, aos seus futuros herdeiros). O Direito não pode chancelar vampirismos afetivos, repita-se.

No caso de trabalhos de cuidado a pessoas idosas ou com saúde vulnerável fora dos casos de curatela, é cabível que a pessoa idosa realize doação remuneratória ao familiar generoso que esteja a prestar os serviços de cuidado. Essa doação remuneratória não é considerada antecipação de herança e, por isso, não é colacionável (art. 2.011, CC[24]). O adequado é que a pessoa vulnerável seja explícita em, no instrumento da doação, vincular a liberalidade como uma remuneração pelo serviço gratuito prestado pelo familiar generoso.

Em inexistindo doação remuneratória e em ocorrendo a morte da pessoa vulnerável, entendemos ser razoável que o juiz fixe uma prestação compensatória ao familiar generoso, como uma espécie de compensação financeira, a ser paga pelo espólio.

Pense, por exemplo, na hipótese de um pai idoso que, nos seus últimos anos de vida, foi beneficiado por uma dedicação incontinenti e extenuante de apenas um dos seus filhos para trabalhos de cuidado, sem que os demais filhos tenham “investido” praticamente nenhum tempo pessoal para cuidar do pai.

É extremamente adequado que, em casos como esses, seja fixada uma prestação compensatória em favor desse filho generoso, como compensação financeira pelo seu trabalho de cuidado. A vedação ao enriquecimento sem causa respalda isso (art. 884, CC), em associação com a vedação ao abuso de direito (art. 187, CC) e com o princípio do solidarismo familiar.

De fato, não é razoável que, do ponto de vista patrimonial, os herdeiros sejam beneficiados indiretamente com o patrimônio que o falecido poupou às custas dos trabalhos de cuidado gratuitos prestados pelo generoso. O falecido, em vez de contratar profissionais para a prestação de trabalhos de cuidado, economizou com os serviços de cuidado gratuitamente prestados por um familiar generoso.

O Anteprojeto de Reforma do Código Civil, elaborado por juristas nomeados pelo Presidente do Senado Federal por meio do ATS nº 11/2023[25], previu uma regra para buscar prestigiar esses trabalhos de cuidado nos últimos dias de vida do falecido, deferindo ao generoso um direito a antecipar 10% da sua quota hereditária ou, no caso de inviabilidade, um direito exclusivo ao direito real de habitação sobre o imóvel de moradia do falecido[26].

Já se trata de um avanço. Neste artigo, vamos um pouco além; defendemos que o juiz – com base no ordenamento atual – deve fixar uma prestação compensatória ao generoso, a ser paga pelo espólio, sem que isso seja considerada uma antecipação da quota hereditária. Durante a tramitação do projeto de reforma do Código Civil, esse assunto poderá vir a ser aprofundado pelos parlamentares.

Conclusão

A Economia de Cuidado tem de estar no radar dos juristas de Direito de Família, conforme exposto ao longo deste texto.

Cabe ao legislador e à jurisprudência marcharem nesse sentido.

No presente texto, sugerimos algumas aplicações práticas, que, apesar de já estarem escoradas indiretamente no ordenamento, mereceriam um acolhimento textual do legislador para pacificação do entendimento.

Em suma, levantamos as seguintes aplicações práticas da Economia do Cuidado no Direito de Família:

a)    Na estrutura sociológica brasileira, ainda predomina uma cultura de atribuição de deveres por perspectiva de gênero, com sobrecarga especialmente da mulher no exercício de trabalhos de cuidado (work care), o que reforça a necessidade de refletir sobre ajustes no Direito de Família com olhos na Economia de Cuidado.

b)    Na definição do período de convivência, do dever do custeio e das demais questões do regime de guarda do filho menor de idade, deve-se prestigiar uma repartição igualitária dos deveres entre ambos os genitores, sem sobrecarga de qualquer um deles e sem a premissa equivocada de que a mulher teria vocação biológica para exercer exclusivamente os trabalhos de cuidado (capítulos 1.1. e 1.4.).

c)    Em relação ao custeio das despesas do filho, o adequado é que cada genitor custeie, in natura, as despesas intramuros do filho durante os respectivos períodos de convivência e distribuam, entre si, o dever de custeio in natura das despesas extramuros. Alimentos pecuniários são excepcionais, como na hipótese de insuficiência financeira de dos genitores em custear as despesas intramuros durante o seu respectivo período de convivência com filho (capítulo 1.1.).

d)    Maior rigor deve haver para o descumprimento de deveres parentais no regime de guarda, preferindo-se punições de índole financeira a reduções de período de convivência (capítulo 1.3.).

e)    Na situação excepcional de um genitor ter assumido os trabalhos de cuidado devidos ao outro por conta do regime de guarda, é devida a fixação de uma pensão compensatória como uma compensação financeira por esse trabalho adicional. Convém que essa pensão compensatória seja fixada de forma autônoma, embora, na prática, ela costume ser admitida implicitamente dentro do valor fixado a título de alimentos fixados ao filho (capítulo 2.2.).

f)     Merece reformulação a tendência de fixação de alimentos transitórios para ex-consorte, especificamente nas hipóteses em que este, por longo tempo, sofreu um “apagão profissional” por ter assumido os trabalhos de cuidado (capítulo 3.1.).

g)    Os alimentos compensatórios devem ser prestigiados como forma de reduzir o abrupto declínio de qualidade de vida após o fim do casamento ou da união estável, notadamente quando o ex-cônjuge beneficiado tiver assumido os trabalhos de cuidado em relacionamentos de longa duração. É preciso, porém, ir além, para permitir os alimentos compensatórios mesmo quando o ex-cônjuge tiver ficado com um patrimônio suficiente após a partilha, desde que seja verificado que ele efetivamente sofreu um apagão profissional ao longo do casamento por ter-se dedicado a trabalhos de cuidado em prol da família. Não se pode, porém, banalizar o instituto. Provas que demonstrem a ausência desses trabalhos de cuidado podem afastar os alimentos compensatórios (capítulo 2.2.).

h)    Na curatela, o juiz deve ser menos incontinente no arbitramento de pro-labore quando inexistir uma Diretiva de Curatela tratando do tema, observada, obviamente, a capacidade financeira da pessoa vulnerável (capítulo 3).

i)     No caso de cuidados voluntários a pessoas idosas ou com vulnerabilidades de saúde, se o beneficiário não tiver realizado doações remuneratórias compatíveis, é devida a fixação de prestação compensatória em favor do generoso após o falecimento da pessoa vulnerável, valor esse a ser pago pelo espólio da pessoa vulnerável (capítulo 3).


[1]     Para uma visão panorâmica do tema de Economia de Cuidado, tida uma forma de trabalho invisível, em diversos ramos do Direito e da Sociedade, recomendamos esta entrevista disponível no canal “Escola de Negócios e Seguros” no YouTube: <https://www.youtube.com/watch?v=eCY1B5J9Oa8>. Acesso em 06 mai. 2024.

[2]     Este texto contou com pesquisas realizadas durante o estágio pós-doutoral em Direito Civil perante a Universidade de São Paulo (USP), sob a supervisão do Professor Dr. Eduardo Tomasevicius Filho e iniciado no ano de 2024.

[3]     Confira-se, por exemplo: POSTHUMA, Anne Caroline. A Economia de Cuidado e o vínculo com o trabalho doméstico: o que as tendências e políticas na América Latina podem ensinar.

[4]     POSTHUMA, Anne Caroline. A Economia de Cuidado e o Vínculo com o Trabalho Doméstico: o que as tendências e políticas na América Latina podem ensinar ao Brasil. In:PINHEIRO, Luana; TOKARSKI, Carolina Pereira; POSTHUMA, Anne Caroline. Entre relações de cuidado e vivências de vulnerabilidade: dilemas e desafios para o trabalho doméstico e de cuidados remunerados no Brasil. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 2021, p. 28. Disponível em: <https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/11441/1/Economia_Cuidado_cap01.pdf>. Acesso em: 06 mai. 2024.  

[5]     Chamamos de boicote hermenêutico a frustração da intenção do legislador por meio de interpretações judiciais ou administrativas (vide OLIVEIRA, Carlos Eduardo Elias de. Entendendo a formação das leis: a interação entre os Três Poderes, o “boicote hermenêutico” e o “justiçamento de transição”. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/373787/enten‌dendo-a-formacao-das-leis>.  Acesso em: 06 mai. 2024).

[6]     Para aprofundamento, veja este artigo: OLIVEIRA, Carlos E. Elias de Oliveira. Guarda compartilhada, regime de convívio e alimentos:uma abordagem crítica. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/341301/guarda-compartilhada-regime-de-convivio-e-alimentos>. Acesso em: 06 mai. 2024.

[7]     OLIVEIRA, Carlos E. Elias de Oliveira. Guarda compartilhada, regime de convívio e alimentos: Uma abordagem crítica. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/341301/guarda-compartilhada-regime-de-convivio-e-alimentos>. Disponível em 06 mai. 2024.

[8]     GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil:direito de família. São Paulo: Saraivajur, 2023, p. 557.

[9]     Para aprofundamento, veja este artigo: OLIVEIRA, Carlos E. Elias de Oliveira. Guarda compartilhada, regime de convívio e alimentos:uma abordagem crítica. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/341301/guarda-compartilhada-regime-de-convivio-e-alimentos>. Acesso em: 06 mai. 2024.

[10]   Nesse sentido, confira-se:

“1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que, em regra, a ação de exigir contas é via inadequada para fiscalização dos recursos decorrentes da obrigação alimentar. Precedentes”.

(STJ, AgInt no AREsp n. 2.389.393/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 2/10/2023, DJe de 5/10/2023.)

“2. Em recente julgamento pela Terceira Turma do REsp nº 1.814.639/RS, firmou-se o entendimento de que, em hipótese excepcional, é viável juridicamente a ação de exigir contas pelo alimentante contra o guardião do alimentado para obtenção de informações acerca da destinação de pensão alimentícia prestada mensalmente, porque tal pretensão, no mínimo, indiretamente está relacionada com a saúde física e também psicológica do menor alimentado, desde que proposta sem a finalidade de apurar a existência de eventual crédito, pois os alimentos prestados são irrepetíveis.

3. No referido julgado firmou-se também o entendimento de que não há apenas interesse jurídico, mas também o dever legal, por força do § 5º do art. 1.538 do CC/02, do genitor alimentante de acompanhar os gastos com o filho alimentado que não se encontra sob a sua guarda, fiscalizando o atendimento integral de suas necessidades materiais e imateriais essenciais ao seu desenvolvimento físico e também psicológico, aferindo o real destino do emprego da verba alimentar que paga mensalmente, pois ela é voltada para esse fim.

3.1. O que justifica o legítimo interesse processual em ação dessa natureza é só e exclusivamente a finalidade protetiva da criança ou do adolescente beneficiário dos alimentos, diante da sua possível malversação, e não o eventual acertamento de contas, perseguições ou picuinhas com a(o) guardiã(ao), devendo ela ser dosada, ficando vedada a possibilidade de apuração de créditos ou preparação de revisional pois os alimentos são irrepetíveis.

4. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos.

5. Agravo interno não provido”.

(STJ, AgInt no REsp n. 1.924.422/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 14/2/2022, DJe de 16/2/2022.)

[11]   ARTICULO 432.- Alimentos. Los cónyuges se deben alimentos entre sí durante la vida en común y la separación de hecho. Con posterioridad al divorcio, la prestación alimentaria sólo se debe en los supuestos previstos en este Código, o por convención de las partes.

Esta obligación se rige por las reglas relativas a los alimentos entre parientes en cuanto sean compatibles.

ARTICULO 433.- Pautas para la fijación de los alimentos. Durante la vida en común y la separación de hecho, para la cuantificación de los alimentos se deben tener en consideración, entre otras, las siguientes pautas:

a) el trabajo dentro del hogar, la dedicación a la crianza y educación de los hijos y sus edades;

b) la edad y el estado de salud de ambos cónyuges;

c) la capacitación laboral y la posibilidad de acceder a un empleo de quien solicita alimentos;

d) la colaboración de un cónyuge en las actividades mercantiles, industriales o profesionales del otro cónyuge;

e) la atribución judicial o fáctica de la vivienda familiar;

f) el carácter ganancial, propio o de un tercero del inmueble sede de esa vivienda. En caso de ser arrendada, si el alquiler es abonado por uno de los cónyuges u otra persona;

g) si los cónyuges conviven, el tiempo de la unión matrimonial;

h) si los cónyuges están separados de hecho, el tiempo de la unión matrimonial y de la separación;

i) la situación patrimonial de ambos cónyuges durante la convivencia y durante la separación de hecho.

El derecho alimentario cesa si desaparece la causa que lo motivó, el cónyuge alimentado inicia una unión convivencial, o incurre en alguna de las causales de indignidad.

[12]   ARTICULO 660.- Tareas de cuidado personal. Las tareas cotidianas que realiza el progenitor que ha asumido el cuidado personal del hijo tienen un valor económico y constituyen un aporte a su manutención.

[13]   Para aprofundamento, veja este artigo: OLIVEIRA, Carlos E. Elias de Oliveira. Guarda compartilhada, regime de convívio e alimentos:uma abordagem crítica. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/341301/guarda-compartilhada-regime-de-convivio-e-alimentos>. Acesso em: 06 mai. 2024.

[14]   DIAS, Maria Berenice.Manual de Direito das Famílias. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 384.

[15]   OLIVEIRA, Carlos E. Elias de Oliveira. Guarda compartilhada, regime de convívio e alimentos: uma abordagem crítica. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/341301/guarda-compartilhada-regime-de-convivio-e-alimentos>. Acesso em: 06 mai. 2024.

[16]   ROSA, Conrado Paulino. Direito de Família Contemporâneo. Salvador: JusPodivm, 2020, p. 517.

[17]   E, aqui, mais uma vez, referimo-nos à mulher pela estrutura sociológica brasileira. Mas o entendimento vale também para casos excepcionais da realidade brasileira, como o de homens que sofrem apagão profissional para se dedicar aos trabalhos de cuidado da família, enquanto a mulher fica livre para crescer no mercado de trabalho.

[18]   DIAS, Maria Berenice.Manual de Direito das Famílias. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 821.

[19]   TARTUCE, Flávio. Direito Civil:direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2023, p. 601.

[20]   A sigla ATS significa Ato do Presidente do Senado Federal. Para pesquisas sobre os trabalhos da Comissão de Juristas, ver mais em: <https://legis.senado.leg.br/comissoes/comissao?codcol=2630>.

[21]   O texto do anteprojeto é este:

Art. 1.688. Ambos os cônjuges ou conviventes são obrigados a contribuir para as despesas do casal na proporção dos rendimentos de seu trabalho e de seus bens, salvo estipulado em contrário no pacto antenupcial, ou em escritura pública de união estável.

§ 1º No regime da separação, admite-se a divisão de bens havidos por ambos os cônjuges ou conviventes com a contribuição econômica direta de ambos, respeitada a sua proporcionalidade.

§ 2º O trabalho realizado na residência da família e os cuidados com a prole, quando houver, darão direito a obter uma compensação que o juiz fixará, na falta de acordo, ao tempo da extinção da entidade familiar.

[22]   DIAS, Maria Berenice.Manual de Direito das Famílias. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 817.

[23]   Sobre a Diretiva de Curatela, reportamo-nos a este artigo: OLIVEIRA, Carlos E. Elias de. Diretiva Antecipada de Vontade lato sensu: o que deve acontecer com a vida, o corpo e o patrimônio no caso de perda de lucidez?Brasília: Núcleo de Estudos e Pesquisas/Conleg/Senado, agosto 2023 (Texto para Discussão nº 320). Disponível em: <www.senado.leg.br/estudos>. Acesso em: 11 ago. 2023.

[24]   Art. 2.011. As doações remuneratórias de serviços feitos ao ascendente também não estão sujeitas a colação.

[25]   Para pesquisas sobre os trabalhos da Comissão de Juristas, ver mais em:<https://legis.senado.‌leg.br/comissoes/comissao?codcol=2630>.

[26]   Art. 1.832. O herdeiro com quem comprovadamente o autor da herança conviveu, e que não mediu esforços para praticar atos de zelo e de cuidado em seu favor, durante os últimos tempos de sua vida, se concorrer à herança com outros herdeiros, com quem disputa o volume do acervo ou a forma de partilhá-lo:

I – terá direito de ter imediatamente, antes da partilha, destacado do montemor e disponibilizado para sua posse e uso imediato, o valor correspondente a 10% (dez por cento) de sua quota hereditária;

II – se forem mais de um os herdeiros nas condições previstas no caput deste artigo, igual direito lhes será garantido, nos termos do §1º;

III – se a herança não comportar as soluções previstas nos §§ 1º e 2º e ela consistir apenas em único imóvel de morada do autor da herança, terão as pessoas apontadas no caput deste artigo direito de ali manterem-se, com exclusividade, a título de direito real de habitação.